Santos M, Almeida A, Chagas D. Papel de Género e Saúde Ocupacional. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2024, 18:esub471. DOI: 10. 31252/RPSO.16.11.2024
GENDER ROLE AND OCCUPATIONAL HEALTH
TIPO DE ARTIGO: Artigo de Revisão
AUTORES: Santos M(1), Almeida A(2), Chagas D(3).
RESUMO
Introdução/enquadramento/objetivos
Os papeis de género influenciam inúmeros aspetos do quotidiano de todos os indivíduos e o contexto laboral não é exceção. A revista já publicou um artigo relativo à eventual diferença a nível de sinistralidade entre géneros e, com esta revisão, pretendem-se abarcar alguns dos restantes itens ocupacionais, de forma que as equipas de Saúde e Segurança do Trabalho possam atingir um melhor desempenho.
Metodologia
Trata-se de uma Revisão Bibliográfica, iniciada através de uma pesquisa realizada em abril de 2023 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.
Conteúdo
Sexo é diferente de género, uma vez que este último conceito abarca aceitação de papeis, construções sociais, comportamentos, interesses e escolhas. A desigualdade entre géneros não se está a agravar, mas sim a sofrer melhorias progressivas.
Estilo de liderança poderá ser definido como o padrão razoavelmente estável, a nível de comportamentos, com o objetivo de motivar, orientar e gerir os liderados, em função dos pontos fortes e fracos. Apesar de cada líder ter usualmente o seu estilo, este não é mantido de forma homogénea em todas as situações. O estilo de liderança geralmente é escolhido em função de questões culturais da sociedade, experiências prévias, género, contextos político/socio/económico, cultura da instituição, metas, perfil dos funcionários e setor profissional. Um líder tem de ser competente e eficaz. Deverá conseguir influenciar as crenças, valores, atitudes e comportamentos dos funcionários, de forma a atingir os objetivos da instituição. Os líderes com sucesso eram vistos como sendo aqueles com determinação, autoridade e coragem; caraterísticas geralmente mais atribuídas ao sexo masculino, o que os coloca em vantagem, neste contexto.
Discussão e Conclusões
Os estereótipos estão inseridos em todos os departamentos da nossa vida; não só poderão existir diferenças a nível de sinistralidade, como também se encontram outras divergências em parâmetros como capacidade e tipos de liderança, remunerações, divisão de tarefas, autonomia, satisfação e coordenação com restantes departamentos (como vida pessoal, familiar e/ou doméstica), ainda que existam alguns aspetos não consensuais ou até contraditórios entre investigadores.
Seria interessante perceber até que ponto as empresas portuguesas se encaixam ou não no que está descrito na generalidade da literatura e de que forma tal influencia variáveis da saúde ocupacional e como isso foi evoluindo ao longo dos anos.
PALAVRAS-CHAVE: papel de género, sexo feminino, sexo masculino, saúde ocupacional, medicina do trabalho, enfermagem do trabalho e segurança no trabalho.
ABSTRACT
Introduction/framework/objectives
Gender roles influence countless aspects of every individual’s daily life and the work context is no exception. The magazine has already published an article regarding the possible difference in accident rates between genders and, with this review, the aim is to cover some of the remaining occupational items, so that Occupational Health and Safety teams can achieve better performance.
Methodology
This is a Bibliographic Review, initiated through a search carried out in April 2023, in the databases “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina and RCAAP”.
Content
Sex is different from gender, as the latter concept encompasses acceptance of roles, social constructions, behaviors, interests and choice. Gender inequality is not worsening, but rather progressively improving.
Leadership style can be defined as a reasonably stable pattern, in terms of behavior, with the aim of motivating, guiding and managing the workers, depending on their strengths and weaknesses. Although each leader usually has their own style, this is not maintained homogeneously in all situations. The leadership style is generally chosen depending on cultural issues of society, previous experiences, gender, political/socio/economic contexts, culture of the institution, goals, employee profile and professional sector. A leader must be competent and effective. You must be able to influence the beliefs, values, attitudes and behaviors of employees, in order to achieve the institution’s objectives. Successful leaders were seen as those with determination, authority and courage; characteristics generally more attributed to males, which puts them at an advantage in this context.
Discussion and Conclusions
Stereotypes are embedded in every department of our lives; not only may there be differences in terms of accident rates, but there are also other divergences in parameters such as capacity and types of leadership, remuneration, division of tasks, autonomy, satisfaction and coordination with other departments (such as personal, family and/or domestic life), although there are some non-consensual or even contradictory aspects among researchers.
It would be interesting to understand to what extent Portuguese companies fit or not with what is described in most literature, how this influences occupational health variables and how this has evolved over the years.
KEYWORDS: gender role, female sex, male sex, occupational health, occupational medicine, occupational nursing and occupational safety.
INTRODUÇÃO
Os papeis de género influenciam inúmeros aspetos do quotidiano de todos os indivíduos e o contexto laboral não é exceção. A revista já publicou um artigo relativo à eventual diferença a nível de sinistralidade entre géneros e, com esta revisão, pretendem-se abarcar alguns dos restantes itens ocupacionais, de forma que as equipas de Saúde e Segurança do Trabalho possam atingir um melhor desempenho.
METODOLOGIA
Em função da metodologia PICo, foram considerados:
–P (population): todos os trabalhadores
–I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre de que forma o género pode alterar algumas variáveis ocupacionais
–C (context): saúde e segurança ocupacionais aplicadas ao papel de género
Assim, a pergunta protocolar será: Os papeis de género conseguem modular variáveis relacionadas com o contexto laboral e, em caso positivo, de que forma?
Foi realizada uma pesquisa em abril de 2023 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.
No quadro 1 podem ser consultadas as palavras-chave utilizadas nas bases de dados.
CONTEÚDO
Sexo é diferente de género, uma vez que este último conceito abarca aceitação de papeis, construções sociais, comportamentos, interesses e escolhas (1) (2).
A desigualdade entre géneros não se está a agravar, mas sim a sofrer melhorias progressivas (3).
Expetativas diferentes para os géneros masculino e feminino
Em alguns países a recessão económica e a liberalização do mercado de trabalho aumentou o número de trabalhadores com insegurança laboral nos países desenvolvidos, para além da possibilidade também acrescida de despromoções e/ou reestruturações A exposição à insegurança laboral prolongada poderá ter efeitos na saúde maiores do que quando é temporária, nomeadamente a nível de ansiedade e depressão; sobretudo quando existem filhos e aí a diferença entre sexos ser mais notória (4), devido aos papeis (pai como responsável pelo sustento económico e mãe como responsável pelos cuidados diretos) (3) (4) (5) (6), com estatuto inferior eventualmente (6), subordinação e dependência. Tal apenas começou a mudar na década de 70, com a maior entrada no mercado de trabalho (3). Aliás, muitos indivíduos defendem que as trabalhadoras, após serem mães, deveriam dedicar-se apenas à família, a tempo inteiro (4). Ainda permanece o mito de que, se a mãe trabalhar, a família ficará prejudicada. Ainda que a maioria das pessoas defenda a igualdade de direitos entre sexos no local de trabalho, menos são aqueles que acreditam em situação equivalente para as tarefas domésticas e familiares. A sociedade tem a expetativa que todas as mulheres sejam mães; daí a relutância que alguns empregadores possam ter em contratar trabalhadoras e/ou as promover posteriormente (7). Assim, por responsabilidades domésticas e familiares, as mulheres efetivamente, com maior probabilidade, fazem pausas na sua carreira (6). Genericamente, o sexo feminino tem menor probabilidade de atingir patamares de segurança laboral mais elevados (4).
Tipos de Liderança e associação ao Género
Estilo de liderança poderá ser definido como o padrão razoavelmente estável, a nível de comportamentos, com o objetivo de motivar, orientar e gerir os liderados, em função dos pontos fortes e fracos. Apesar de cada líder ter usualmente o seu estilo, este não é mantido de forma homogénea em todas as situações. O estilo de liderança geralmente é escolhido em função de questões culturais da sociedade, experiências prévias, género, contextos político/socio/económico, cultura da instituição, metas, perfil dos funcionários e setor profissional. É expetável que os estereótipos e os papeis de género se transformem e/ou atenuem (6).
Os estudos iniciais sobre este tema refletiam a realidade norte-americana de algumas décadas atrás. Um líder tinha de ser competente e eficaz. Deveria conseguir influenciar as crenças, valores, atitudes e comportamentos dos funcionários, de forma a atingir os objetivos da instituição. Os líderes com sucesso eram vistos como sendo aqueles com determinação, autoridade e coragem; caraterísticas geralmente mais atribuídas ao sexo masculino, o que os coloca em vantagem, neste contexto (6).
Os estilos de liderança parecem ser distintos na maioria dos casos, ou seja, os homens têm uma liderança mais transicional (3) (6) [autocrática e diretiva (6)] e as mulheres mais transformacional (3) (5) (6) (democrática e participativa), sendo ambos considerados mais competentes quando se mantêm no estilo de liderança associado a cada estereótipo; caso contrário, os trabalhadores não costumam apreciar a situação e com maior probabilidade verão esse líder como mais incompetente- a adoção de um estilo de liderança poderá ser para evitar conflitos com os estereótipos de papel de género (6)- consultar Quadro 2.
A liderança transacional, associa-se à existência de uma troca entre líder e liderado, de forma a satisfazer os interesses de todos; desde o início todos conhecem as suas responsabilidades, tarefas e objetivos/metas (6). Aqui valorizam-se as promoções e o retorno económico (3) (6), ou seja, a recompensa pela obediência ao líder e desempenho (3). Geralmente evitam-se riscos e valoriza-se a produtividade e eficiência; dando atenção aos erros e à correção destes, antes de se transformarem em algo mais grave. A liderança transformacional, é conhecida por incentivar os funcionários a fazer mais do que o necessário, ou seja, superar objetivos (6); estes líderes inspiram (3) (6), motivam e promovem a mudança, valorizando o compromisso e o sucesso da instituição; transmitem confiança e respeito aos trabalhadores. As necessidades do grupo são para o líder mais relevantes do que as suas. Dá uma visão otimista do futuro (6); o líder quer que os trabalhadores se identifiquem com ele, encorajando-os a assumir riscos; pretendem-se influenciar valores, atitudes e crenças; mudar para aumentar a eficiência. Os líderes transformacionais podem ser autênticos ou não (3). Este segundo estilo de liderança é considerado mais eficaz por alguns, sobretudo a nível de desempenho, satisfação, motivação, esforço extra, criatividade, inovação e bem-estar. Outros autores concluíram que o estilo de liderança não depende do género e não altera a perceção de eficácia. Na realidade, não há consensos: alguns investigadores afirmam que não existem estilos de liderança mais eficazes, enquanto outros atribuem tal à transformacional (6), como atrás referido.
Outra classificação de liderança considera também o estilo “laissez-faire”, ou seja, uma atitude de indiferença para os funcionários (6). Na liderança ética, por usa vez, valoriza-se o tomar a atitude certa, dar o exemplo; o líder é visto como virtuoso e com moral; promove o desenvolvimento de emoções e normas nos liderados e potencia o desempenho. Por sua vez, na liderança autêntica há nível elevado de autoconsciência; expressão de sentimentos verdadeiros e opiniões perante os liderados, aprendizagem observacional; facilitação da comunicação entre a equipa. A liderança responsável é próxima à transformacional, na medida em que também quer inspirar a estimular os trabalhadores; ainda que a segunda valorize mais o desempenho e o atingimento de objetivos e a primeira a ética, moral e bem-estar (3).
As qualidades geralmente associadas a um líder estão mais comummente associadas à masculinidade (5). O sexo feminino geralmente está por isso em desvantagem para atingir cargos de chefia (6); culturalmente elas eram vistas como tendo menos atributos para liderar (5) (6) e/ou progredir na carreira (6). Mas os cargos de gestão/liderança são progressivamente cada vez mais ocupados pelo sexo feminino. Contudo, para que uma mulher se destaque, parece que tem de ter um esforço e desempenho muito superiores a um colega do sexo masculino; daí que talvez se candidatem menos a cargos de gestão, por receio de discriminação e não por falta de ambição ou de autoconfiança. Algumas mulheres podem ficar cansadas de ter de superar tantas barreiras e acabam por desistir, com maior probabilidade. Estima-se que em 1965 apenas 15% dos cargos de gestão eram femininos; três décadas depois esse valor passou para 40%. Mesmo com as medidas de discriminação positiva que alguns governos estão a tomar, tal parece não ser suficiente para equilibrar a situação (5), apesar de atenuarem o problema (6) e parecendo que as equipas mistas funcionam melhor (5). É meta da União Europeia, a nível de igualdade de género, ter mais mulheres em postos de liderança. Neste contexto, a Suécia tem a posição mais favorável e a Hungria está na situação oposta. Em Portugal, a diferença parece ser superior em empresas de maior dimensão. A diferença na distribuição dos cargos de líder não se pode justificar pelas habilitações e/ou competências. Ter uma mulher num cargo de liderança gera geralmente mais desaprovação (6). No Japão, por exemplo, a maioria considera que o sexo feminino tem mais capacidades para gerir. Contudo, a generalidade dos funcionários a nível internacional aprecia mais um líder masculino. Para além disso, as líderes femininas não são vistas como ideais sobretudo em instituições predominantemente masculinas. Indivíduos mais jovens e com mais habilitações parecem aceitar melhor a liderança feminina (5). Assim, não só os líderes femininos são vistos como tendo menos caraterísticas para chefiar como, se adotarem as caraterísticas opostas, geram mais desaprovação. Aliás, mesmo exibindo os mesmos comportamentos, elas são geralmente consideradas menos competentes e adequadas (6). As expetativas que existem para os líderes, variam então consoante o seu género (5).
Por isso, também existe controvérsia em relação ao facto de, genericamente, serem os homens ou as mulheres os melhores líderes. Não existe nenhum sexo com mais capacidade de liderança.
A generalidade dos trabalhadores parece considerar que ambos os sexos conseguem ter uma liderança responsável, ou seja, preocupada com a sustentabilidade ambiental e com outras organizações e comunidade. Contudo, genericamente, os indivíduos do sexo masculino são escolhidos com maior probabilidade para serem líderes e, genericamente, apresentar vencimento superior, mesmo fazendo as mesmas tarefas (3).
A liderança feminina foca-se num estilo mais democrático. Os homens geralmente dão mais enfase à tarefa, dando ordens, ou seja, em versão autocrática. As mulheres geralmente são menos firmes ou seguras. Por isso, alguns defendem que, genericamente, o sexo feminino tem mais capacidade para chefiar. Por estereótipo criou-se a noção que as mulheres não tinham essas competências e a perceção da generalidade dos trabalhadores acabar por se associar aos estereótipos em vigor; ainda que mesmo assim alguns possam defender que elas serão melhores líderes em contexto de interação social e relacionamento interpessoal, e os homens, quando for necessário mais severidade, assertividade e disciplina. Quando o líder vai contra o estereotipado para o seu género, é geralmente avaliado de forma mais negativa pelos trabalhadores (3), como já se mencionou.
Contudo, na realidade encontram-se estudos publicados com conclusões em todas as direções e até se afirma que não parecem existir diferenças significativas na forma de liderar entre homens e mulheres. Na realidade, todos somos únicos, com visões singulares e capazes de dar alguma contribuição positiva à liderança, construindo uma sociedade mais equilibrada, em que homens e mulheres tenham os mesmos direitos e deveres (3).
Implicações laborais concretas
As expetativas relativas ao papel de género podem originar diferentes exposições ocupacionais e diversos desfechos (8).
Quando o trabalho apresenta três turnos, é mais provável que o sexo feminino fique com maior probabilidade no 1º e o masculino no 2º e 3º, devido geralmente a diferentes responsabilidades familiares e domésticas. Contudo, na generalidade dos trabalhos os turnos diurnos apresentam tarefas mais pesadas e/ou frequentes; enquanto os noturnos se podem associar a maior probabilidade de acidentes (8).
A percentagem de bulling é substancialmente diferente entre sexos (e de forma estatisticamente significativa) (8)- o feminino é mais vulnerável (9). O burnout também parece ser mais frequente neste género. As intervenções em situações de bulling e burnout deverão ser distintas, em função do sexo. Em alguns contextos o sexo feminino pode percecionar mais stress (8).
Dentro dos indivíduos com limitações, o sexo feminino apresenta ainda mais dificuldades para se manter empregado (três vezes mais, por vezes) (10), bem como salários menores (10) (11) e mais insatisfação laboral (10). Nestes indivíduos é ainda mais relevante que o apoio vocacional seja orientado em função do género. Trabalhadoras com deficiências geralmente trabalham menos horas, com maior probabilidade estão/ficam desempregadas, têm menos autoconfiança e menos formação (11).
O sexo feminino geralmente é mais problemático com as relações interpessoais, expetativas de género, autoidentidade e equilíbrio do trabalho com os restantes departamentos da vida (10). É geralmente mais complicado para elas atingir um equilíbrio entre trabalho e vida pessoal/familiar/doméstica; o que influencia a forma de estar no trabalho e o respetivo impacto na saúde (jornada dupla e/ou até tripla). Os estudos laborais geralmente não avaliam a distribuição de tarefas domésticas e familiares (12). Apesar da evolução, o sexo feminino ainda assume mais tarefas familiares e domésticas (com quociente de 1,6 em países como Canadá, Bélgica, França, Alemanha e EUA); com filhos esse quociente fica ainda mais penalizador para as mulheres (2). Quando a remuneração do marido não é suficiente, a esposa pode ficar ainda mais ansiosa por o seu vínculo ser inseguro e a sua contribuição financeira eventualmente deixar de existir (4). Na generalidade, o sexo feminino ocupa postos de trabalho de subordinação e apresenta maior vulnerabilidade/insegurança no mercado de trabalho (12).
Entre trabalhadores com mais idade, geralmente o sexo feminino deixa a vida laboral ativa mais precocemente. As trabalhadoras geralmente apresentam mais sintomas depressivos; talvez tal possa ser parcialmente justificado pela menor autonomia e menor variabilidade nas tarefas. Para além disso, trabalhadoras idosas geralmente têm mais diagnósticos médicos (1). Existem sintomas/limitações que dificultam o regresso ao trabalho, sem que o impossibilitem; o termo que define tal em inglês é “disability”. As questões médicas que mais contribuem para isto são as alterações músculo-esqueléticas e as patologias emocionais/psiquiátricas, bem como cancros e outras doenças crónicas. O regresso ao trabalho ocorre mais rapidamente e com maior frequência para o sexo masculino.
Em algumas profissões a taxa de suicídio parece ser equivalente; noutras pode haver alguma diferença entre sexos, ainda que geralmente não significativa. Trata-se de uma situação multifatorial e complexa (com variáveis associadas ao trabalho, sociodemográficas, pessoais e socioambientais); ainda que na maioria dos países a taxa de suicídio seja superior no sexo masculino e, com maior probabilidade, com métodos mais violentos. Para além disso, menos habilitações também se associam a maior risco de suicídio; tal como tarefas mais manuais (13).
Mesmo quando indivíduos de ambos os sexos estão no mesmo setor, com frequência realizam tarefas diferentes, geralmente tendo como base da diferenciação alguns estereótipos de género (12). Potenciando a autonomia e variabilidade de tarefas, melhorará a saúde mental geral, tal como a diferença entre géneros (1).
São necessárias medidas governamentais e laborais que realmente garantam igualdade entre os sexos (2). Mesmo para postos iguais, o sexo feminino geralmente ganha salários menores (mesmo com igual desempenho). Elas são também mais prevalentes nos setores pior remunerados, bem como com regimes de trabalho em part-time (7) (11) e/ou temporário (11). Por vezes, passam mais duas a três horas no trabalho sem remuneração e, na Polónia, ganham cerca de 9% menos (7), por exemplo.
O género pode justificar discriminação profissional ao nível do recrutamento, remuneração e progressão na carreira. Alguns países desenvolveram legislação para atenuar esta questão (7).
Os mitos associados à maternidade podem contribuir para a discriminação; ou seja, que as mães estarão a ser negligentes se valorizarem o trabalho, que não deverão conquistar grandes objetivos a este nível e que os pais não devem se dedicar muito a cuidar dos filhos. As mesmas atitudes passam mais despercebidas quando se associam ao sexo masculino. Mesmo com incentivos governamentais para licença partilhada, os pais continuam geralmente a usar o mínimo e as mães a usar o máximo (7).
O sexo feminino, contudo, costuma ter mais autoestima e estabilidade emocional, segundo alguns estudos; o que também pode se associar a maior satisfação laboral; geralmente também costumam ser mais extrovertidas, o que também poderá ser uma vantagem a este nível (14).
Levar em conta as diferenças laborais que a diferença de géneros implica, contribuiu para um ambiente de trabalho mais saudável e funcional (8).
DISCUSSÃO/ CONCLUSÃO
Os estereótipos estão inseridos em todos os departamentos da nossa vida; não só poderão existir diferenças a nível de sinistralidade (resumidas noutro artigo publicado nesta revista), como também se encontram outras divergências em parâmetros como capacidade e tipos de liderança, remunerações, divisão de tarefas, autonomia, satisfação e coordenação com restantes departamentos (como vida pessoal, familiar e/ou doméstica); apesar de a literatura não ser consensual em todos os parâmetros.
Seria interessante perceber até que ponto as empresas portuguesas se encaixam ou não no que está descrito na generalidade dos artigos e de que forma tal influencia variáveis da saúde ocupacional e como isso foi evoluindo ao longo dos anos.
CONFLITOS DE INTERESSE, QUESTÕES ÉTICAS E/OU LEGAIS
Nada a declarar.
AGRADECIMENTOS
Nada a declarar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Quadro 1: Pesquisa efetuada
Motor de busca | Password 1 | Password 2 e seguintes, caso existam | Critérios | Nº de documentos obtidos | Nº da pesquisa | Pesquisa efetuada ou não |
RCAAP | Papel de género | -título e/ ou assunto
|
118 | 1 | sim | |
EBSCO (CINALH, Medline, Database of Abstracts and Reviews, Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Nursing & Allied Health Collection e MedicLatina) | Gender role | -2013 a 2023
-acesso a resumo -acesso a texto completo |
1624 | 2 | não | |
+ work | 353 | 3 | sim |
Quadro 2: Caraterísticas mais comummente associadas aos diferentes géneros
Feminino | Masculino |
Gestão do tempo (5)
Organização (5) Precisão (5) Inteligência emocional (5) Otimismo (5) Maior envolvimento em conflitos (5) Compreensão (5) Responsabilidade social (5) e outras Bondade (6) Carinho (6) Humildade (3) (6) Amigabilidade (6) Gentilidade (6) Altruísmo (6) Afetuosidade (6) Emotividade (6) Sensibilidade (6) Adaptabilidade à mudança (3) Coordenação de várias tarefas ao mesmo tempo (3) Atenção ao detalhe (3) Atenciosidade (3) Encorajamento à partilha (3) Envolvimento, compromisso com a instituição (3) Empatia, Proximidade (3) Intuição (3) Participação (3) |
Ambição (3) (5)
Objetividade (5) (6) Autocracia (5) Querer mandar (5) Apreciar mais ser o centro das atenções (5) Exibir poder (5) Ousadia (6) Assertividade (3) (6) Competitividade (3) (6) Coragem (6) Independência (6) Lógica (6) Dominância (3) Agressividade (3) Diretividade (3) |
(1)Mónica Santos
Licenciada em Medicina; Especialista em Medicina Geral e Familiar; Mestre em Ciências do Desporto; Especialista em Medicina do Trabalho; Diretora da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online; Técnica Superior de Segurança no Trabalho; Doutorada em Segurança e Saúde Ocupacionais e CEO da empresa Ajeogene Serviços Médicos Lda (que coordena os projetos Ajeogene Clínica Médica e Serviços Formativos e 100 Riscos no Trabalho). Endereços para correspondência: Rua da Varziela, 527, 4435-464 Rio Tinto. E-mail: s_monica_santos@hotmail.com. ORCID Nº 0000-0003-2516-7758
Contributo para o artigo: seleção do tema, pesquisa, seleção de artigos, redação e validação final.
(2)Armando Almeida
Escola de Enfermagem (Porto), Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica Portuguesa; Centro de Investigação Interdisciplinar em Saúde; Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional. 4420-009 Gondomar. E-mail: aalmeida@ucp.pt. ORCID Nº 0000-0002-5329-0625
Contributo para o artigo: seleção de artigos, redação e validação final.
(3)Dina Chagas
Doutorada em Higiene, Saúde e Segurança no Trabalho; Pós-Graduada em Segurança e Higiene do Trabalho; Pós-Graduada em Sistemas Integrados de Gestão, Qualidade, Ambiente e Segurança. Professora convidada no ISEC Lisboa. Membro do Conselho Científico de várias revistas e tem sido convidada para fazer parte da comissão científica de congressos nos diversos domínios da saúde ocupacional e segurança do trabalho. Colabora também como revisor em várias revistas científicas. Galardoada com o 1.º prémio no concurso 2023 “Está-se Bem em SST: Participa – Inova – Entrega-Te” do projeto Safety and Health at Work Vocational Education and Training (OSHVET) da EU-OSHA.1750-142 Lisboa. E-Mail: dina.chagas2003@gmail.com. ORCID N.º 0000-0003-3135-7689.
Contributo para o artigo: seleção de artigos, redação e validação final.