TIPO DE ARTIGO: Resumo de trabalho divulgado noutro contexto
AUTORES: Santos M(1), Almeida A(2).
INTRODUÇÃO
As tarefas executadas numa cozinha abundam em fatores de risco/ riscos profissionais; contudo, alguns destes não são óbvios para o trabalhador, como é o caso da exposição aos fumos/ vapores dos cozinhados (em terminologia inglesa: COFs, ou seja, cooking oil fumes). Para além disso, num número significativo destes trabalhadores, essa mesma exposição também poderá existir a nível domiciliário, sendo o efeito cumulativo.
Outros (fatores de) risco(s) assinaláveis são o manuseamento de cargas, queda de objetos, queda ao mesmo nível (por escorregar numa superfície humedecida/ engordurada ou por tropeçar num objeto), queimadura, desconforto térmico (devido a temperaturas baixas, elevadas e transição entre as mesmas), uso de instrumentos/ máquinas perigosas, ruído, vibrações, agentes biológicos (dos cadáveres dos animais), agentes químicos (na limpeza) e stress organizacional (secundário ao cumprimentos de timings e ordens da chefia).
CONTEÚDO
Os COFs são constituídos por compostos carcinogénicos, claramente identificados e produzidos sobretudo quando a comida é cozinhada a temperaturas muito elevadas. Aliás, a Agência Internacional de Pesquisa para o Cancro (IARC) qualificou recentemente os produtos daqui resultantes como “provavelmente carcinogénicos para humanos”. O efeito depende do processo (mais perigoso com o ato de fritar e a temperaturas mais elevadas) e da frequência das exposições (número de anos que se cozinha, número de vezes por dia e duração de cada exposição), bem como da existência ou não de ventilação/ exaustor no local de trabalho/ domicílio. Contudo, não é apenas o ato de cozinhar: o uso de combustíveis fósseis (carvão, madeira) produzem/ libertam substâncias nocivas como metais pesados, hidrocarbonetos policíclicos, CO2, CO; dióxido de nitrogénio, dióxido de enxofre e formaldeído; técnicas essas de cozinha ainda muito frequentes em alguns países.
Um número significativo dos estudos encontrados reporta-se à realidade dos domicílios/ restaurantes chineses, porque a incidência/ prevalência de patologia oncológica pulmonar no sexo feminino é muito elevada (sendo que o tabagismo é muito pouco significativo neste contexto)- daí se ter colocado a hipótese de existir algo no ambiente doméstico que justificasse tal. Um destes estudos quantificou que a concentração de hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAPs) na generalidade das cozinhas chinesas é superior à existente num ambiente tabágico pesado (quantificado pelo consumo de cerca de 96 cigarros num espaço temporal de cerca de seis horas). Para além disso, a cozinha chinesa abunda no uso de fritos e/ ou outros processos equivalentes, onde é típico aquecer o óleo até temperaturas muito elevadas, antes de introduzir os alimentos. O ato de fritar produz aerossóis suficientemente pequenos para chegarem às vias respiratórias, causando (além de uma maior probabilidade de surgir patologia cancerígena) irritabilidade/ obstrução, aumento do fluxo nasal, tosse e dispneia (dificuldade respiratória). Para além disso, as vias de entrada destas substâncias não se resumem à inalatória, uma vez que a absorção também ocorre cutaneamente ou através da ingestão.
Dentro da patologia oncológica há particular destaque para o aparelho respiratório (sobretudo pulmão), mesmo em não fumadores, ainda que potenciado pelo tabaco. Outro artigo demonstrou também existir maior risco de carcinoma na zona nasofaríngea. Calculou-se que o risco de vir a ter cancro do pulmão, ao cozinhar cerca de três vezes por dia (face a um indivíduo sem exposição), ainda que de forma não profissional (no domicílio) é cerca de três a quatro vezes superior; variável com o tipo de cozinhado, tempo de exposição e sistema de ventilação. O risco de neoplasia encontra-se potenciado mesmo após três décadas de exposição aos COFs.
CONCLUSÕES
A exposição aos COFs exige um óptimo sistema de extração/ ventilação, bem como técnica melhorada para cozinhar (ou seja, evitar temperaturas muito elevadas e/ ou aquecer o óleo previamente à introdução dos alimentos), como medidas de proteção coletiva e, nas situações em que essas medidas não sejam suficientes, ponderar o uso de equipamentos de proteção individual adequados (ainda que não mencionados em nenhum dos artigos consultados).
Para além disso, as Equipas de Saúde Ocupacional que atuem neste setor têm o dever de ter conhecimento atualizados acerca do tema, de modo a (in)formar as entidades empregadoras e respetivos trabalhadores. Seria também muito interessante avaliar a realidade portuguesa e investigar quais as melhores medidas de proteção coletiva e individual a utilizar.
BIBLIOGRAFIA
Santos M, Almeida A. O que está oculto nos fumos das cozinhas (COF, COFs)… Revista Segurança. 2013, julho- agosto, 215: 24-25.
(1)Licenciada em Medicina; Especialista em Medicina Geral e Familiar; Mestre em Ciências do Desporto; Especialista em Medicina do Trabalho; Presentemente a exercer nas empresas Medicisforma, Clinae, Servinecra e Serviço Intermédico; Diretora Clínica da empresa Quercia; Diretora da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line; Endereços para correspondência: Rua Agostinho Fernando Oliveira Guedes, 42 4420-009 Gondomar; s_monica_santos@hotmail.com.
(2)Mestre em Enfermagem Avançada; Especialista em Enfermagem Comunitária; Pós-graduado em Supervisão Clínica e em Sistemas de Informação em Enfermagem; Docente na Escola de Enfermagem, Instituto da Ciências da Saúde- Porto, da Universidade Católica Portuguesa; Diretor Adjunto da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line; aalmeida@porto.ucp.pt
Santos M, Almeida A. COFS (Cooking Oil Fumes).Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. 2016, volume 2, s91-s92. DOI:10.31252/RPSO.12.10.2016