Santos M, Almeida A, Lopes C, Oliveira T. Radiação Ótica Artificial em contexto de Saúde Ocupacional- a Scoping Review. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. 2020, volume 9, 1-10. DOI: 10.31252/RPSO.14.03.2020
ARTIFICIAL OPTICAL RADIATION IN OCCUPATIONAL HEALTH CONTEXT- A SCOPING REVIEW
TIPO DE ARTIGO: Scoping Review
AUTORES: Santos M(1), Almeida A(2), Lopes C(3), Oliveira T(4).
RESUMO
Introdução/ enquadramento/ objetivos
A maior parte dos trabalhadores e dos profissionais a exercer em equipas de Saúde Ocupacional não valorizará particularmente este fator de risco laboral, sobretudo quando colocado em comparação com os outros que também possam existir no posto de trabalho; pelo que os conhecimentos acerca desta área também não estão particularmente desenvolvidos, nem a bibliografia abunda. Pretende-se com esta revisão resumir o que de mais recente e pertinente se publicou sobre o tema.
Metodologia
Trata-se de uma Scoping Review, iniciada através de uma pesquisa realizada em setembro de 2019 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina, Academic Search Ultimate, Science Direct, Web of Science, SCOPUS e RCAAP”.
Conteúdo
Muitos trabalhadores estão expostos a esta radiação, nomeadamente através da iluminação e dos visores monitores de computadores; logo, a regra de suprimir a exposição (como se tenta por vezes fazer com outros riscos) não tem a mesma aplicabilidade neste contexto. Aliás, em áreas como a Saúde e Arte/ Espetáculos os limites da diretivas podem ser ultrapassados com relativa facilidade. Qualquer luz artificial, interna ou externa, também aqui se enquadra (mesmo a proveniente do veículos automóveis). Ela é particularmente frequente nos seguintes setores/ tarefas profissionais: trabalhos com altas temperaturas (vidro ou metal), setor gráfico, tratamentos estéticos, trabalho em áreas fechadas e com iluminação de alta intensidade, esterilização, soldadura, soldagem a laser no fabrico de plástico, atividades com processamento de materiais (corte, marcação, perfuração/ fotolitografia), medição ótica, comunicações, armazenamento de informações óticas e espetroscopia.
Conclusões
O tema não cativa a mesma atenção que outros fatores de risco laborais, pelo que está pouco desenvolvido e uma parte da população nem terá noção de que existe.
Seria interessante que equipas nacionais de Saúde Ocupacional, com clientes com grande número de funcionários expostos, investigasse melhor o assunto, quantificando os conhecimentos dos trabalhadores/ chefias e empregadores, registando a semiologia e patologias associadas, clarificando quais os subtipos de radiações envolvidos nas diversas tarefas, sugerindo ainda medidas válidas de proteção coletiva e individual (especificando modelo e/ ou materiais).
PALAVRAS/ EXPRESSÕES- CHAVE: radiação ótica artificial, saúde ocupacional e medicina do trabalho.
ABSTRACT
Introduction / framework / objectives
Most workers and professionals working in Occupational Health teams will not particularly value this occupational risk factor, especially when compared with others that may also exist in the workplace; therefore, knowledge about this area is not particularly developed, nor is the bibliography abundant. The aim of this review is to summarize the most recent and pertinent publications on the subject.
Methodology
This is a Scoping Review, initiated by a September 2019 search of the databases “CINALH plus with full text, Medline with full text, Cochrane Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: Comprehensive, MedicLatina, Academic Search Ultimate, Science Direct, Web of Science, SCOPUS and RCAAP”.
Content
Many workers are exposed to this radiation, particularly through lighting and computer displays; therefore, the rule of suppressing exposure (as sometimes attempted to do with other risks) does not have the same applicability in this context. In areas such as Health and in some Shows/ Art manifestations the limits of the directives can be overcome. Any artificial light, internal or external, also fits in this concept (even from motor vehicles). It is particularly frequent in the following professional sectors/ tasks: high temperature work (glass or metal), graphic work, aesthetic treatments, indoor work with powerful lighting, sterilization, welding, laser welding in plastic manufacturing, activities material processing (cutting, marking, drilling/ photolithography), optical measurement, communications, optical information storage and spectroscopy.
Conclusions
The theme does not adresses the same attention as other occupational risk factors, so it is poorly developed and some of the population will not even know it exists.
It would be interesting for national Occupational Health teams, with clients with large numbers of employees exposed, to better investigate the issue, quantifying the knowledge of workers/ managers and employers, recording the semiology and associated pathologies, clarifying which radiation subtypes are involved in the various tasks, also suggesting valid collective and individual protection measures (specifying model and/ or materials).
KEY WORDS / EXPRESSIONS: artificial optical radiation, occupational health and occupational medicine.
INTRODUÇÃO
A Radiação Ótica Artificial (ROA) inclui a luz emitida de todas as fontes artificiais, em todas as suas formas, como raios ultravioleta, infravermelho e laser. Algumas destas formas de luz artificial podem ser prejudiciais aos trabalhadores, a menos que medidas de proteção estejam em vigor, contudo, considerando a diversidade de situações em que esta exposição ocorre, acredita-se que a maior parte dos trabalhadores e dos profissionais a exercer em equipas de Saúde Ocupacional, poderá não conhecer ou valorizar particularmente este fator de risco laboral, sobretudo quando comparado com outros que também possam existir no posto de trabalho.
Apesar da bibliografia ser escassa nas diversas bases de dados cientificas pesquisadas, é possível encontrar algumas recomendações, nos motores de busca eletrónica generalistas, sem que se perceba às vezes a base que fundamentou as diversas indicações. Nesse sentido, realizou-se uma pesquisa bibliográfica no sentido de perceber que conhecimentos deverão ter as equipas de saúde ocupacional para proteger a saúde dos trabalhadores expostos a fontes de Radiação Ótica Artificial.
METODOLOGIA
Efetuou-se uma scoping review para responder à pergunta protocolar: o que se sabe sobre a exposição laboral a Radiação Ótica Artificial?
Em função da metodologia PICo, foram considerados:
–P (population): trabalhadores expostos a radiação ótica artificial.
–I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre a radiação ótica artificial
–C (context): saúde ocupacional nas empresas com postos de trabalho com exposição a radiação ótica artificial.
Foi realizada uma pesquisa em setembro de 2019 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina, Academic Search Ultimate, Science Direct, Web of Science, SCOPUS e RCAAP”.
No quadro 1 podem ser consultadas as palavras/ expressões-chave utilizadas.
CONTEÚDO
Caraterísticas da Radiação Ótica Artificial
A Radiação Ótica Artificial (ROA) é o termo dado à radiação eletromagnética (REM) que pode causar danos oculares [1].
Os comprimentos de onda mais curtos estão na região azul e os mais longos na vermelha [1]. A radiação infravermelha (IV), micro-ondas e radioelétrica são radiações com comprimentos de onda cada vez mais longos; por usa vez, a radiação ultravioleta (UV), Rx e raios Gama têm comprimentos de onda cada vez mais curtos. Quando a REM contata com um material, provavelmente fornece alguma energia, situação essa que pode originar reações bioquímicas.
Quanto mais curto o comprimento de onda, mais energia existirá. Logo, a luz azul é potencialmente mais danosa que a verde e esta mais que a vermelha: no setor do visível a radiação UV é a mais energética. O comprimento de onda interfere também com o patamar de penetração [1].
A radiação ótica compreende a REM com comprimento de onda entre os 100nm e 1mm. Entre os 100nm e os 400nm está a UV (UVA 100-400nm; UVB 315-400nm; UVC 100-280nm). Entre os 780nm e 1mm estão os IV (IVA 780-1400nm; IVB 1400-3000nm e IVC 3000nm-1mm). A luz visível está entre os 380 e os 780nm. A luz azul, por sua vez, situa-se entre os 300 e os 700nm [2].
A radiação UV é não ionizante e situa-se no fim da zona azul da luz visível/ Raios X (400 a 100 nm); a capacidade de provocar danos é inversamente proporcional ao comprimento de onda (como já se mencionou) e diretamente proporcional ao tempo de exposição. A radiação UVA tem a energia mais baixa e, por isso, é a menos lesiva; a UVC está na posição oposta e a UVB fica num patamar intermédio [3].
Fontes de Radiação Ótica Artificial
Muitos trabalhadores estão expostos à ROA, nomeadamente através da iluminação e dos écrans de computadores; logo, a regra de suprimir a exposição (como se tenta por vezes fazer com outros riscos) não tem a mesma aplicabilidade neste contexto. Aliás, em áreas como a Saúde e em alguns espetáculos, os limites da diretivas podem ser ultrapassados com relativa facilidade [1]; este último setor apresenta alguma complexidade a este nível [4]. Qualquer luz artificial, interna ou externa, também aqui se enquadra (mesmo a proveniente do veículos automóveis) [1], por exemplo.
Entre as fontes de ROA pouco relevantes e, por isso, avaliadas como eventualmente seguras, podem ser consideradas:
- iluminação fluorescente com ou sem difusores sobre as lâmpadas ou através de projetores
- ecrãs de computador ou equivalentes
- armadilhas para insetos com UVA
- fotocopiadoras
- quadros brancos interativos
- LEDs (Light Emitting Diode ou diodo emissor de luz)
- luzes dos veículos (nevoeiro, marcha-atrás, travões e pisca)
- flash fotográfico
- aquecedores radiantes de teto a gás e iluminação das ruas[1].
À partida, também se podem considerar sem grande relevância médica:
- iluminação do teto sem difusores (se superiores a 600 lux)
- iluminação com projetores com lâmpadas de mercúrio de alta pressão/ halogeneto metálico (seguro se o vidro estiver intacto e se não se estiver na linha de mira)
- projetores de secretária (seguro se não se olhar diretamente para o feixe)
- luz negra UVA de baixa pressão (também se não se olhar diretamente)
- laser classe 1 (seguro se a proteção estiver intacta)
- faróis dianteiros (se não se olhar de forma direta e prolongada para o feixe) [1].
Quanto a ROAs utilizadas especificamente em contexto médico, podem ser destacadas:
- iluminação do posto de trabalho (mais intensa no bloco cirúrgico)
- iluminação de diagnóstico (transiluminação do feto, aparelho oftalmológico, lâmpada de Wood)
- terapêutica (fototerapia UV, luz azul, fotodinâmica, fisioterapia, cirurgia)
- computadores
- negatoscópios
- câmaras de fluxo laminar
- simuladores solares[1].
Alguns autores destacam, contudo, que as lâmpadas portáveis de UV podem ser bastante perigosas, até porque geralmente não estão encapsuladas/ isoladas, como acontece com outras fontes e/ ou podem ter o invólucro não íntegro [1].
No quadro 2 estão registadas algumas fontes de produção de radiações específicas.
Setores Profissionais mais relevantes
A ROA é particularmente frequente nos seguintes setores/ tarefas profissionais:
- trabalhos com altas temperaturas, como os que envolvem vidro ou metal (IV)
- setor gráfico (em que as tintas envolvem fotopolimerização)
- arte e espetáculo (projetores e efeitos luminosos especiais; holografia- projeção de imagens)
- radiação UV para revelar colorações fluorescentes
- tratamentos estéticos com IVs e UVs
- trabalho em áreas fechadas, com iluminação potente
- esterilização por UVs (como na produção de fármacos, investigação ou tratamento de águas residuais)
- soldadura
- soldagem a laser no fabrico de plásticos
- atividades com processamento de materiais (corte, marcação, perfuração/ fotolitografia)
- medição ótica
- medicina (oftalmológica, cirúrgica, terapia fotodinâmica, dermatologia, medicina dentária, diagnóstico geral)
- comunicações (fibra, espaço livre, satélite)
- armazenamento de informações óticas (CD/ DVD, impressora)
- espetroscopia (identificação de substâncias)[1].
Algumas radiações provenientes de alguns tipos de soldadura são muito intensas [5] [6], ainda que variável com o método específico, sobretudo a nível de radiação UV e visível; deve-se ainda considerar a radiação refletida e a proveniente do sistema de iluminação/ luz natural [6]. A radiação UV da soldadura pode causar eritema e fotoqueratite ocular; se a exposição for crónica poderá ocorrer envelhecimento cutâneo e patologia oncológica dermatológica. A radiação azul é também muito relevante a nível de danos oftalmológicos, neste contexto. Contudo, apesar das medidas de proteção coletiva e EPIs, os soldadores com frequência estão expostos a valores superiores aos máximos recomendados pelas normas [5]. Entre a ROA mais lesiva destaca-se a originada pela soldadura com arco de alguns metais; esta existe em inúmeros postos de trabalho e também é praticada, por vezes, no domicílio [7].
Todas as situações com maior risco em contexto hospitalar estavam associadas à radiação UV. A iluminação usada nos blocos operatórios é muito brilhante (tungsténio-halogénio), ainda que não seja frequente os profissionais olharem diretamente para o feixe (cima) [8].
As lâmpadas com UV são também usadas, por exemplo, na deteção de alguns estupefacientes (como crack), em contexto de veículos (automóveis e aviões). A generalidade dos trabalhadores receia estas lâmpadas, sobretudo devido às informações que circulam nos mass media, relativas à exposição em solários artificiais [3].
Assim, entre a principais fontes de ROA destacam-se a soldadura, fornos de secagem de pintura, metalurgia, trabalhos com vidro, bem como equipamentos médicos (laser, fototerapia, neonatal, esterilização, luzes no bloco operatório). Menos atenção é dada à iluminação de escritórios, écrans, fotocopiadoras, scanners e LEDs; ainda que, por vezes, o tempo de exposição possa ser prolongado [2].
Classificação da Radiação Ótica Artificial
A ROA divide-se em radiação laser e não coerente. Os feixes laser geralmente têm um único comprimento de onda ou um número pequeno de comprimentos de onda diferentes; contudo, a baixa divergência mantém a potência ou energia, mesmo a distâncias consideráveis. No entanto, existem lasers com muitos comprimentos de onda e/ ou feixes divergentes [1].
Na classificação de segurança dos lasers podem ser consideradas as seguintes categorias:
- 1- seguros, mesmo se olhar direto e de forma prolongada para o feixe (exemplo: impressoras, gravadores e leitores de CD/ DVD, bem como laser de processamento de materiais); pode provocar encandeamento, sobretudo se a luz ambiente for fraca
- 1M- seguros a olho nu e em condições normais de utilização; perigosos com o uso de lupas ou telescópios; podem provocar encandeamento, sobretudo com luz ambiente fraca
- 2- emitem radiação visível e são seguros para exposições curtas, mesmo com instrumentos de observação ótica, mas podem causar dano se se olha diretamente para o feixe; supõe-se que o desvio do olhar e/ ou pestanejar sejam proteção suficiente
- 2M- seguros para a exposição a olho nu e breve; o pestanejar proporciona proteção
- 3R- risco baixo com exposição breve
- 3B- perigosos com exposição direta a determinada distância ocular (menos de 13 centímetros e mais que 10 segundos); podem causar lesões cutâneas e risco de incêndio de substâncias inflamáveis
- 4- perigosos para o olho (com exposição direta) e pele; risco de incêndio[1].
Contudo, esta classificação não abrange os riscos que possam existir nas situações de reparação/ manutenção e também não considera exposições múltiplas [1].
Lasers de classe 1 são seguros e não necessitam de nenhuma avaliação; contudo, as classes 3B e 4 podem causar lesões oculares e os de classe 4 também lesões cutâneas. Num local de trabalho onde existam as classes 3B e 4 deverá existir um trabalhador que assuma a responsabilidade pela segurança dos lasers [1].
Valores limite
Para proteção da córnea, conjuntiva e pele em relação à radiação UV em geral, para um turno de trabalho de oito horas, estabeleceu-se o limite de 30 J/m2 (180 a 400 nm). Para a UVA (315 a 400 nm) esse valor passa para 10 KJ/m2 [3] [9].
Poderá ser problemático o cumprimento desses valores em alguns setores profissionais, como o das filmagens que, por vezes, atingem dez horas por dia, com exposição frequente e intensa [9].
No documento da ACT (caraterizado na bibliografia) existem vários quadros relevantes que registam os valores limite de exposição (consoante o tempo, zona do corpo atingida e tipo de radiação) [1], cuja consulta será pertinente.
Eventuais consequências médicas
A radiação ótica é absorvida pela superfície do corpo, pelo que as consequências geralmente estão limitadas à pele e olhos (com especial vulnerabilidade para o cristalino); os efeitos fotoquímicos predominam na região do UV e os térmicos em contexto de IV [1]. A resposta de aversão à ROA não é equivalente entre indivíduos, logo, a eficácia como mecanismo de defesa não é uniforme [4]. Os efeitos podem ser agudos ou crónicos [1]. Outro artigo realça também que a radiação ótica entre os 180 e os 3000 nms é absorvida pelas camadas superficiais do organismo (sobretudo pele e olho), causando alterações secundárias a mecanismos fotoquímicos e/ ou térmicos. Os primeiros dependem da intensidade e tempo de exposição; os segundos, por sua vez, dependem mais da capacidade que o tecido tem para conduzir o calor (dependente da intensidade e dimensão da área atingida). Globalmente, também é relevante o comprimento de onda [10].
No quadro 3 estão registadas as principais consequências para o olho e pele, em função dos diversos tipos de radiação.
A maioria da radiação UV que incide na pele é absorvida pela epiderme (embora comprimentos de onda específicos possam penetrar mais). A exposição excessiva e por períodos breves poderá originar eritema e edema, oito a vinte e quatro horas depois e com até três a quatro dias de duração, com posterior hiperpigmentação, desidratação e/ ou descamação. A longo prazo a consequência mais séria é a patologia oncológica cutânea. A exposição crónica pode provocar elastose e eventuais alterações na função imunitária [1]. O principal efeito positivo é a produção de vitamina D [1] [3].
A radiação ultravioleta que atinge o olho é absorvida pela córnea a cristalino (quer A, quer B). é possível o surgimento de fotoqueratite e fotoconjuntivite (também conhecidas como “cegueira da neve ou do soldador”); os sintomas principais são a fotofobia e a dor; podem desaparecer até cerca de trinta minutos depois ou durar até vinte e quatro horas, em função da intensidade da exposição. A exposição crónica a UVA e UVB pode levar à formação de cataratas, em função das alterações proteicas no cristalino. Também podem ser lesionadas a córnea e conjuntiva, nomeadamente na queratopatia da gotícula (depósitos amarelos/ acastanhados), pterígio (crescimentos excessivo de tecido sobre a córnea) e/ ou pinguécula (lesão amarela e proliferativa da conjuntiva) [1].
A radiação visível penetra cutaneamente, aumentando a temperatura (atenuada com a vasodilatação e sudação) e poderá levar a queimadura [1].
A retina apresenta risco superior ao da pele em relação à radiação visível, sobretudo quando se olha de forma prolongada; a contração pupilar e o desvio do olhar constituem mecanismo de defesa. A nível ocular esta pode causar danos equivalentes à radiação UV, ainda que o brilho da luz colabore como mecanismo de proteção. As lesões fotoquímicas na retina podem causar uma deficiente visão noturna e da cor [1].
Um laser muito potente, por sua vez, poderá provocar destruição total das células atingidas [1].
A radiação IVA na pele e olhos pode causar os mesmos danos que a radiação visível. Contudo, a retina não consegue perceber a presença da radiação IV, pelo que não existem os mesmos mecanismos de proteção que para a luz visível. A exposição crónica pode também levar a cataratas. A IVA não tem energia suficiente para ocorram danos fotoquímicos. A IVB, na pele, pode levar aos mesmos danos térmicos que a radiação visível e a IVA. A nível ocular, também podem ocorrer cataratas. Quanto aos IVC, a nível ocular, o dano mais relevante é a queimadura da córnea [1].
Outros artigos, ainda que não especificando por tipo de radiação, publicaram que, a nível ocular, podem ocorrer globalmente fotoqueratite, conjuntivite, catarata, pterígio e melanoma ocular. Por sua vez, em contexto cutâneo poderá surgir eritema, queimadura, fotoenvelhecimento, melanoma, carcinoma de células basais ou escamosas [6]. Assim, a foto/ querato/ conjuntivite, o melanoma e a catarata são razoavelmente frequentes [11] sobretudo nos soldadores [6]. Outro artigo também salientou que não são raros o eritema, fotoconjuntivite, fotoqueratite; bem como elastose, cancro de pele e cataratas, como efeitos agudos e crónicos, respetivamente [3].
Existem agentes químicos que têm a capacidade de potenciar a fotossensibilidade, nomeadamente alguns antibióticos (tetraciclina, sulfametoxazol, trimetopim), ansiolíticos, diuréticos (tiazidas), hipnóticos (fenobarbitol), carvão/ creosoto, alguns cosméticos e vegetais (cenoura, figo, limão). Estes produtos podem contatar com o organismo através da ingestão, administração injetável ou por via cutânea (a intensidade e timing dos efeitos depende da via de entrada) [3].
Efeitos indiretos a considerar que poderão ser problemáticos (em contexto laboral) são a luz ofuscante, explosão e incêndio (sobretudo com lasers de classe 4) [1].
Medidas de Proteção Coletiva
Dentro da bibliografia selecionada, apenas um documento mencionou algumas medidas de proteção coletiva, nomeadamente:
- desligar fontes de radiação que não sejam estritamente necessárias naquele momento
- substituição de equipamentos ou processos mais perigosos, por outros menos danosos
- alterar o equipamento para atenuar a produção de radiação
- interrupção do processo se existir um trabalhador na proximidade
- encapsulamento total ou com pequenas janelas de observação devidamente protegidas
- elaborar documento com a política da empresa em relação a este tema e descrição dos procedimentos, bem como trabalhadores expostos e os funcionários responsáveis por orientar o assunto
- entregar aos trabalhadores a cópia da avaliação de riscos
- manter o registo dos trabalhadores autorizados às etapas e/ ou locais mais perigosos
- estruturar um plano de emergência (lasers de classe 3B e 4)
- criar um plano de auditoria
- manter as áreas mais perigosas interditas por barreiras, fechaduras ou teclados codificados
- implementar sinalização de segurança (tipo de perigo e EPIs recomendados ou obrigatórios) e
- assegurar a formação e consulta aos trabalhadores[1].
Medidas de Proteção Individual (EPIs)
Quanto a medidas de proteção individual, podem ser realçadas as seguintes:
- óculos[1]/ máscara [1] [7]/ escudo facial- a escolha depende do comprimento de onda, potência/ energia, densidade ótica e necessidade de graduação do trabalhador; bem como exigência visual global/ perceção da cor e existência de reflexos [1].
- luvas
- farda com mangas compridas e/ ou manguitos de material adequado
- botas/ calçado adequado[7].
Por exemplo, não é raro que os soldadores, iniciem o procedimento sem máscara, colocando-a apenas posteriormente; a formação e treino dos funcionários são por isso muito relevante [7].
DISCUSSÃO/ CONCLUSÃO
O estudo de revisão comprova a existência de dano potencial para os trabalhadores induzido pela ROA. Contudo, o tema não cativa a mesma atenção que outros fatores de risco laborais, pelo que está pouco desenvolvido e uma parte da população nem terá noção de que existe.
Seria interessante que equipas nacionais de Saúde Ocupacional, com clientes com grande número de funcionários expostos, investigasse melhor o tema, quantificando os conhecimentos dos trabalhadores/ chefias e empregadores, registando a semiologia e patologias associadas, clarificando quais os subtipos de radiações envolvidos nas diversas tarefas, sugerindo ainda medidas válidas de proteção coletiva e individual (especificando modelo e/ ou materiais).
CONFLITOS DE INTERESSE, QUESTÕES ÉTICAS E/OU LEGAIS
Nada a declarar.
AGRADECIMENTOS
Nada a declarar.
BIBLIOGRAFIA
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Quadro 1: Pesquisa efetuada
Motor de busca | Password 1 | Password 2 e seguintes, caso existam | Critérios | Nº de documentos obtidos | Nº da pesquisa | Pesquisa efetuada ou não | Nº do documento selecionado na pesquisa | Codificação inicial | Codificação final |
RCAAP | Radiação ótica artificial | -pesquisa avançada
-título |
0 | 1 | Não | ||||
Radiação óptica artificial | 0 | 2 | Não | ||||||
Radiação ótica artificial | -pesquisa avançada
-texto integral |
26 | 3 | Sim | |||||
Radiação óptica artificial | 27 | 4 | Sim | ||||||
EBSCO | Artificial Optical Radiation | -com acesso a resumo
-humano |
11 | 5 | Sim | 2
4 5 11 |
5.1
5.2 5.3 5.4 |
10
11 4 8 |
|
Science Direct | 21.530 | 6 | Não | ||||||
+ occupational | 507 | 7 | Não | ||||||
Anterior + health | 443 | 8 | Não | ||||||
Anteriores + medicine | 243 | 9 | Sim | ||||||
“Artificial Optical Radiation” | 24 | 10 | Sim | ||||||
SCOPUS | Artificial Optical Radiation | 957 | 11 | Não | |||||
+ occupational | 25 | 12 | Sim | 1
3 5 6 7
9 13 16 18 22 23 26 27 28 29
30 31 33 34 |
12.1
12.2 12.3 12.4 12.5= 5.1 mas completo 12.6 =5.2 =5.3 – – 12.7 – 12.8 – 12.9 =5.4 mas completo 12.10 – – – |
5
– 6 7 – 2 – – – – – – – – – 3 – – – |
|||
Academic Search Ultimate | “Artificial Optical Radiation” | 9 | 13 | Sim | 4 | 13.1 | 9 |
Quadro 2-Fontes de algumas radiações, por produção propositada ou acidental
Radiação | Utilização | Acidentalmente produzida |
UVC | Esterilização por fluorescência (laboratórios) e fotolitografia | Tratamento de tintas, iluminação, soldadura com arco |
UVB | Solário, fototerapia, fluorescência (laboratório) e fotolitografia | Lâmpadas germicidas, tratamento de tintas, iluminação e soldadura com arco |
UVA | Fluorescência (laboratório, espetáculos, atividades forenses), fototerapia, solário, tratamento de tintas, armadilhas de insetos e fotolitografia | Lâmpadas germicidas, iluminação e soldadura de arco |
Visível | Iluminação, semáforos, remoção de varizes e pelos, tratamento de tintas, armadilhas de insetos, fotolitografia, fotocópias, projeção, ecrãs de televisão e computador | Solário, aquecimento/ secagem e soldadura |
IRA | Luz de vigilância, aquecimento, secagem, remoção de varizes e pelos, comunicações | Iluminação, soldadura |
IRB | Aquecimento/ secagem, comunicações | Iluminação, soldadura |
IRC | Aquecimento/ secagem | Iluminação, soldadura [1] |
Quadro 3: Registo das principais consequências para o olho e pele, em função dos diversos tipos de radiação.
Radiação | Olhos | Pele |
UVC | fotoqueratite, fotoconjuntivite | eritema, cancro |
UVB | fotoqueratite, fotoconjuntivite, cataratas | eritema, elastose (fotoenvelhecimento) e cancro |
UVA | fotoqueratite, fotoconjuntivite, cataratas, lesões na retina | eritema, elastose e hiperpigmentação |
Visível | lesões na retina (queimadura) | queimadura [1] |
IVA | cataratas, queimadura na retina | |
IVB | cataratas | |
IVC | queimadura na córnea |
(1)Mónica Santos
Licenciada em Medicina; Especialista em Medicina Geral e Familiar; Mestre em Ciências do Desporto; Especialista em Medicina do Trabalho e Doutoranda em Segurança e Saúde Ocupacionais, na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Presentemente a exercer nas empresas Medicisforma, Servinecra, Securilabor e Medimarco; Diretora Clínica da empresa Quercia; Diretora da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. Endereços para correspondência: Rua Agostinho Fernando Oliveira Guedes, 42, 4420-009 Gondomar. E-mail: s_monica_santos@hotmail.com
(2)Armando Almeida
Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária, com Competência Acrescida em Enfermagem do Trabalho. Doutorado em Enfermagem; Mestre em Enfermagem Avançada; Pós-graduado em Supervisão Clínica e em Sistemas de Informação em Enfermagem; Professor Auxiliar Convidado na Universidade Católica Portuguesa, Instituto da Ciências da Saúde – Escola de Enfermagem (Porto) onde Coordena a Pós-Graduação em Enfermagem do Trabalho; Diretor Adjunto da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. 4420-009 Gondomar. E-mail: aalmeida@porto.ucp.pt
(3)Catarina Lopes
Licenciada em Enfermagem, desde 2010, pela Escola Superior de Saúde Vale do Ave. A exercer funções na área da Saúde Ocupacional desde 2011 como Enfermeira do trabalho autorizada pela Direção Geral de Saúde, tendo sido a responsável pela gestão do departamento de Saúde Ocupacional de uma empresa prestadora de serviços externos durante 7 anos. Atualmente acumula funções como Enfermeira de Saúde Ocupacional e exerce como Enfermeira Generalista na SNS24. Encontra-se a frequentar o curso Técnico Superior de Segurança do Trabalho. 4715-028. Braga. E-mail: catarinafflopes@gmail.com
(4)Tiago Oliveira
Licenciado em Enfermagem pela Universidade Católica Portuguesa. Frequenta o curso de Técnico Superior de Segurança no Trabalho. Atualmente exerce a tempo inteiro como Enfermeiro do Trabalho. No âmbito desportivo desenvolveu competências no exercício de funções de Coordenador Comercial na empresa Academia Fitness Center, assim como de Enfermeiro pelo clube de futebol União Desportiva Valonguense. 4435-718 Baguim do Monte. E-mail: tiago_sc16@hotmail.com