Santos M, Almeida A, Chagas D. Pacemaker: quais os cuidados a ter em contexto laboral? Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2025, 19: esub0479. DOI: 10.31252/RPSO.18.01.2025
PACE-MAKER: WHAT PRECAUTIONS SHOULD BE TAKEN AT WORK?
TIPO DE ARTIGO: Artigo de Revisão
AUTORES: Santos M(1), Almeida A(2), Chagas D(3).
RESUMO
Introdução/enquadramento/objetivos
O uso de pacemaker não é muito prevalente, mas quase todos os profissionais da Saúde Laboral já devem ter tido alguns clientes com este equipamento e, por vezes, ter ficado com alguma dúvida, sobretudo em relação a situações em que poderá haver alguma interferência discreta a moderada, dado geralmente os indivíduos estarem mais alertados para as situações profissionais que podem causar alterações graves e/ou consensuais, da parte da equipa que colocou o dispositivo.
Metodologia
Trata-se de uma Revisão Bibliográfica, iniciada através de uma pesquisa realizada em abril de 2024 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.
Conteúdo
O dispositivo é constituído por um gerador de pulso e um ou dois cabos-elétrodos; o primeiro funciona energeticamente devido a bateria incorporada. Os cabos elétricos são fios metálicos revestidos por material isolador (silicone ou poliuretano), com um ou dois polos metálicos, com as extremidades posicionadas no átrio e/ou ventrículo.
A tecnologia tem vindo a ser progressivamente aperfeiçoada, de forma a sofrerem cada vez menos interferências e menos relevantes. Os primeiros aparelhos funcionavam sem interação com o ritmo do próprio coração. Mais recentemente foram desenvolvidos modelos com capacidade de interagir e coordenar com o ritmo do coração. Os últimos, por sua vez, conseguem se ajustar parcialmente às exigências metabólicas do momento (em função da informação proveniente do movimentos, temperatura, respiração e contratilidade cardíaca, por exemplo).
A nível de resultados são ainda destacadas várias classificações possíveis de diversos tipos de interferência, realçando as respetivas gravidades e probabilidades de ocorrência, bem como algumas especificidades em relação a grupos/tarefas profissionais e ainda qual a postura que a generalidade das equipas de Saúde e Segurança deveriam ter perante este tema.
Discussão e Conclusões
Não existem consensos absolutos em relação ao que é seguro e o que não é; ainda assim, a generalidade dos investigadores concorda que os equipamentos são construídos cada vez com mais qualidade, perante as interferências domiciliares, sociais e laborais, e que existem situações que quase de certeza não causam problemas e outras que provavelmente o farão, existindo um outro grupo de fatores em posição intermédia.
Seria interessante perceber se as empresas portuguesas têm noção das interferências que podem surgir e se preocupam em minimizar o perigo, perante os funcionários que se identificam como portadores deste tipo de equipamento, perante os profissionais de saúde, sobretudo nos postos com maquinaria/tarefas mais relevantes neste contexto.
Palavras-chave: pacemaker, marcapasso, saúde ocupacional, medicina do trabalho, enfermagem do trabalho e segurança no trabalho.
ABSTRACT
Introduction/framework/objectives
The use of pacemakers is not very prevalent, but almost all Occupational Health professionals already had some clients with this equipment and, at times, had some doubts, especially in relation to situations in which there may be some discreet/moderate interference, as individuals are generally more alert to professional situations that can cause serious and/or consensual by the team that placed the device.
Methodology
This is a Bibliographic Review, initiated through a search carried out in April 2024 in the databases “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina and RCAAP”.
Content
The device consists of a pulse generator and one or two electrode cables; the first works energetically due to the built-in battery. Electrical cables are metallic wires covered with insulating material (silicone or polyurethane), with one or two metallic poles, with the ends positioned in the atrium and/or ventricle.
Technology has been progressively improved, so that they suffer less and less interference and are less relevant. The first devices worked without interacting with the heart’s own rhythm. More recently, models have been developed with the ability to interact and coordinate with the heart rhythm. The latter, in turn, are able to partially adjust to the metabolic demands of the moment (depending on information from movements, temperature, breathing and cardiac contractility, for example).
In terms of results, several possible classifications of different types of interference are also highlighted, with the respective severities and probabilities of occurrence, as well as some specificities in relation to professional groups/tasks and also the measures taken by most Health and Safety teams should have on this topic.
Discussion and Conclusions
There are no absolute consensuses regarding what is safe and what is not; even so, most researchers agree that equipment is built in an increasingly safer way in the face of domestic, social and work interference and that there are situations that almost certainly do not cause problems and others that probably will, with another group of factors in an intermediate position.
It would be interesting to understand whether Portuguese companies are aware of the interference that may arise and are if they are concerned with minimizing the danger, in the face of employees who identify themselves as carrying this type of equipment, in relation to healthcare professionals, especially in positions with more relevant machinery/tasks in this context.
Keywords: pacemaker, occupational health, occupational medicine, occupational nursing and occupational safety.
INTRODUÇÃO
O uso de pacemaker não é muito prevalente, mas quase todos os profissionais da Saúde Laboral já devem ter tido alguns clientes com este equipamento e, por vezes, ter ficado com alguma dúvida, sobretudo em relação a situações em que poderá haver alguma interferência discreta a moderada, dado geralmente os indivíduos estarem mais alertas para as situações profissionais que podem causar alterações graves e/ou consensuais, da parte da equipa que colocou o dispositivo.
Pretendeu-se com esta revisão bibliográfica resumir sobretudo algumas guidelines existentes, de forma a que se consiga proporcionar um ambiente de trabalho o mais seguro possível.
METODOLOGIA
Em função da metodologia PICo, foram considerados:
–P (population): trabalhadores portadores de pacemaker
–I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre quais as interferências laborais possíveis neste tipo de equipamentos
–C (context): saúde e segurança ocupacionais aplicadas a funcionários que usem marcapasso.
Assim, a pergunta protocolar será: Quais os aspetos que poderão existir em contexto ocupacional, com capacidade para causar interferências no funcionamento do pacemaker, ainda que de intensidade e/ou consensualidade variáveis?
Foi realizada uma pesquisa em abril de 2024 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.
No quadro 1 podem ser consultadas as palavras-chave utilizadas nas bases de dados. No quadro 2 estão resumidas as caraterísticas metodológicas dos artigos selecionados. Contudo, dada a escassez de literatura, utilizou-se também o motor de busca generalista Google e, utilizando as mesmas palavras-passe, obtiveram-se três documentos (1,2,3).
CONTEÚDO
Caraterísticas dos Pacemakers
O dispositivo é constituído por um gerador de pulso e um ou dois cabos-elétrodos; o primeiro funciona energeticamente devido a bateria incorporada. Os cabos elétricos são fios metálicos revestidos por material isolador (silicone ou poliuretano), com um ou dois polos metálicos, com as extremidades posicionadas no átrio e/ou ventrículo (1).
Evolução ao longo do tempo
A tecnologia tem vindo a ser progressivamente aperfeiçoada, de forma a sofrerem cada vez menos interferências e menos relevantes. Os primeiros aparelhos funcionavam sem interação com o ritmo do próprio coração. Mais recentemente foram desenvolvidos modelos com capacidade de interagir e coordenar com o ritmo do coração. Os últimos, por sua vez, conseguem se ajustar parcialmente às exigências metabólicas do momento (em função da informação proveniente do movimentos, temperatura, respiração e contratilidade cardíaca, por exemplo) (1).
Fatores que conseguem causar Interferências
Podem interferir sinais elétricos, fenómenos mecânicos ou químicos extrínsecos; ou seja, fontes eletromagnéticas ou mecânicas (2).
As interferências eletromagnéticas pode ser:
-conduzidas: propagação através de meio físico
-irradiadas- sem meio físico
-radiadas- ionizantes (raios gama) ou não ionizantes- ondas de rádio (2).
Os efeitos eletromagnéticos podem ser permanentes ou transitórios; endógenos (miopotenciais) ou exógenos (2).
As interferências mecânicas podem ser secundárias a vibrações ou a variações de temperatura (2).
Em relação aos riscos de interferências, a classificação abarca três categorias:
-aceitável
-aceitável com riscos (sem consenso)
-inaceitável- consenso de que não devem ser realizados salvo em situações muito excecionais (2).
-interferências gerais
As interferências podem ser agrupadas em quatro categorias:
-inerentes ao marcapasso (autoinibição, deflagração, pós-potenciais)
-coração (sensibilidade anormal da onda t, cabo-elétrodo ventricular bipolar mal posicionado)
-paciente (miopotenciais) e ao
-ambiente (1).
Outra classificação estrutura as interferências em cinco categorias:
-inibição do estímulo
-deflagração não apropriada
-reversão do gerador para funcionamento assíncrono
-mudança de programação- por REM (radiação eletromagnética) é muito rara e
-aceleração indevida (1).
As interferências pode ocorrer por:
-contato físico com o aparelho elétrico, possibilitando a passagem de corrente elétrica
-campo elétrico, ou seja, mesmo sem contato físico
-campo magnético ou
-ação mecânica (vibrações), se o marcapasso tiver sensores de movimento (1).
Em função do tipo e intensidade, as interferências podem desencadear uma de quatro circunstâncias:
-disfunção transitória reversível
-disfunção permanente
-disrritmia e
-alteração do comportamento da junção (1).
A interferência do ambiente pode ser estruturada em:
-doméstica
-social
-profissional e
-hospitalar (1).
Em contexto doméstico o risco é geralmente menor, dado os Campos Eletromagnéticos (CEM ) erem razoavelmente suaves. Contudo, parte destes equipamentos também pode existir em contexto laboral, como é o caso de alguns eletrodomésticos, com destaque para os micro-ondas- pelo remoto risco de fuga (por vedação insuficiente), o indivíduo deverá ficar a pelo menos dois metros quando o mesmo estiver em funcionamento. No geral, deve sobretudo ser evitado o contato direto do gerador com o eletrodoméstico em funcionamento (rádio, televisão, tomadas, interrutor, telefone, telemóvel, portão elétrico, controlo remoto, máquina de lavar, frigorífico, secador, batedeira, aquecedor, liquidificador, ferro de passar a roupa, exaustor, forno, computador, ar condicionado, lâmpada fluorescente, torneira elétrica, altifalante com íman potente e/ou brinquedo elétrico (1).
A generalidade dos choques elétricos varia entre 110 e 220 volts e podem inibir, deflagrar, reverter ou alterar o circuito de sensibilidade do pace-maker. Recomenda-se que o equipamento seja revisto sempre em caso de choque elétrico (1).
Qualquer aparelho que causa vibrações pode interferir, ainda que, geralmente, sem grande relevância clínica (a nível de equipamentos domésticos) (1).
A turbulência hídrica (por exemplo, na hidromassagem) poderá interferir, mas tal ocorrerá em circunstâncias laborais numa pequeníssima percentagem de trabalhadores (spa, cuidados termais) (1).
Teoricamente, também a turbulência acústica poderá causar interferências, ainda que, na maioria dos casos, sem relevância (1).
Acredita-se que a sauna não conseguirá interferir, para além de que esta existirá também num pequeníssimo número de trabalhadores. Em circunstâncias equivalentes estarão os tapetes rolantes e as bicicletas estacionárias, para indivíduos que trabalham associados ao desporto.
A eletricidade estática também não costuma ser relevante neste contexto (1).
Assim, de forma sucinta, acredita-se que as condições existentes em ambiente doméstico não terão capacidade de interferir de forma significativa (1).
Por sua vez, em relação ao ambiente social, são mencionados os detetores de metais, de abertura de portas e/ou alguns mecanismos anti roubo, aos quais um grupo restrito de trabalhadores poderá estar exposto. Os equipamentos atrás mencionados podem interferir, inibir, deflagrar, reverter e até alterar a programação. Logo, a evicção dos mesmos é recomendada (1).
Quanto a transformadores de linha de alta tensão, os indivíduos com pacemaker não deverão se aproximar a menos que quatro metros (1).
Por sua vez, escadas rolantes, elevadores e rádios com frequência privada, parecem não ter capacidade de interferir (1), como já mencionado.
Cabines de comando em aviação deverão ser evitadas; os restantes locais do avião não são problemáticos (1).
Quanto aos telemóveis, dependerá do sistema usado; ou seja, enquanto no Brasil se acredita que não há capacidade para interferir, a tecnologia existente nos EUA e europa já o poderá fazer. Daí que haja a recomendação de não aproximar o telemóvel do pacemaker a menos que quinze centímetros e utilizar de forma contralateral (1).
A proximidade de um motor automóvel poderá interferir, mas apenas como mecânico e não como motorista ou passageiro a caminho do trabalho; considera-se ser razoavelmente seguro ficar pelo menos a um metro, se a ignição estiver ligada (1).
A nível de desporto, sobretudo com ativação muscular próxima, pode causar interferências nos marcapassos apenas unipolares (1).
A atividade sexual não interfere e, para além disso, englobar a mesma em atividade laboral, só num número restrito de países, em que tal é visto como posto de trabalho, não sendo o caso de Portugal (1).
Quanto à generalidade dos equipamentos que existem em parques de diversão, shoppings e salas de espetáculos, considera-se que tal não interfere de forma significativa (1).
Por sua vez, quanto ao ambiente profissional restrito, existem CEM com capacidade para causar interferências graves, nomeadamente em setores de fornecimento de energia elétrica, indústria mecânica, siderúrgica, eletrónica; empresas de telecomunicações, transportes, transformação da madeira e plástico; bem como hospitais e outros serviços de saúde (1).
No caso das empresas de fornecimento energia elétrica, existem CEM intensos, cuja presença de indivíduos com marcapasso está contraindicada; ainda que possam exercer funções em áreas em que tal não ocorra. As linhas de alta tensão estão também contraindicadas (1).
Nas indústrias mecânica e siderúrgica também existem elevados CEM, nomeadamente em aparelhos de soldadura elétrica, com arco voltaico (onde se podem atingir valores na ordem dos 300 amperes em corrente contínua e alternada, que podem conseguir alguma interferência. Para o caso de motores elétricos de grande volume, recomenda-se a distância de pelo menos dois metros. Na indústria eletrónica também podem se criar CEM relevantes, para além de alguns equipamentos de soldadura. Os técnicos de televisão (reparação) podem contatar com fontes de CEM com capacidade para interferir no marcapasso. Quanto a empresas de telecomunicações, poderão existir transmissores de radiofrequência AM, FM e televisão, que podem inibir geradores de pulsos unipolares. Radares geralmente não têm capacidade para interferências significativas (1).
Na indústria transformadora da madeira e plásticos existem secadores, furadores e lixadeiras que podem causar interferências, tarefas essas que deverão estar interditadas (1).
Quanto a eletricistas, a maioria trabalha com baixa voltagem e, sobretudo se protegidos com luvas e botas adequadas, o risco não parece ser significativo (1).
Indivíduos que trabalham com computador, não parecem ter risco acrescido (1).
A nível do setor da saúde, existem equipamentos com capacidade para causar interferências (1). Equipamentos que fazem eletrocauterização (1) (3) (como o bisturi elétrico) são os que apresentam maior probabilidade de interferir, sobretudo se unipolar, versus bipolar (1); a corrente elétrica é transformada em calor ao passar pelos tecidos e tal gera alterações eletromagnéticas que podem causar interferências (3). O risco pode ser atenuado se se aplicar a corrente de forma perpendicular ou programando-se o pacemaker para sensibilidade bipolar (1) ou se se usar bisturi unipolar intermitente, pulsos de curta duração e com menor energia (3). Também ajuda usar baixas energias de corte e coagulação, bem como ter o equipamento em bom estado. Está recomendado iniciar o procedimento após monitorização com ECG (1), colocar o equipamento a mais que 15 centímetros (1) (3), usar o menor nível de energia possível, ter disponível a possibilidade de reprogramar o pacemaker, usar a eletrocauterização de forma intermitente e em pulsos de curta duração (por exemplo, inferiores a um segundo). Equipamentos relacionados com suporte respiratório e hemodinâmico geralmente não causam interferências relevantes. Os campos magnéticos estáticos e alternantes provenientes da Ressonância Magnética Nuclear (RMN) podem interferir de forma imprevisível com o pacemaker e/ou causar danos permanentes; logo, está contraindicada. Se ela realmente for muito relevante, monitorizar durante o exame e reavaliar o pacemaker, para reprogramação (1). Outros autores defendem que os marcapassos mais modernos são considerados mais seguros perante a RMN, nomeadamente alguns dos produzidos a partir de 2010; devido a alterações nos materiais utilizados (não ferromagnéticos) e alterações no software (3). A ablação por cateter de radiofrequência pode causar interferências, ainda que geralmente seja de forma transitória; a utilização de um íman é preventiva. Aumenta a segurança colocar o dispositivo em sensibilidade bipolar e cumprir a distância mínima protocolada. A cardioversão e desfibrilação interferem momentaneamente, ainda que a disfunção possa ser permanente; os marcapassos unipolares são mais sensíveis. Ajuda a minorar o risco se a aplicação for a pelo menos quinze centímetros, de forma perpendicular, antero-posterior e com íman. O aparelho deve ser reavaliado após o procedimento. A litotrícia, por sua vez, pode danificar o marcapasso devido ao seu campo elétrico. Atenua o risco se este for programado de modo assíncrono e numa frequência superior ao ritmo sinusal do indivíduo. Se a aplicação da energia for subcutaneamente, mais próxima do cálculo renal, o risco é menor. A diatermia, ou seja, geração de calor através de ondas eletromagnéticas (ondas curtas e microondas) pode causar disritmias ou até disfunção permamente. Equipamentos que não interferem são a ecografia (incluindo ecocardiograma), Holter, radiografia, mamografia, tomografia e eletroencefalografia. A radioterapia, por sua vez, se com doses cumulativas superiores a 500 rads, poderá ter consequências. Deve-se colocar uma barreira com chumbo, bem como cumprir a distância mínima de segurança (1); outros publicaram que, ainda que a interferência é cada vez menos provável, através de alterações de software e hardware (3). A neuroestimulação elétrica e a eletromiografia podem interferir; logo devem ser evitadas. A acupuntura não interfere, exceto se existir estimulação elétrica (eletroacunputura), que está contraindicada (1). Pacemakers com configurações unipolares podem ter interferências provenientes de CEM potentes (4).
Em contexto específico de medicina dentária equipamentos de diatermia podem interferir (já atrás mencionados); considera-se segura uma distância de pelo menos 35 centímetros (1). No geral, os aparelhos usados a nível de procedimentos dentários, quando geram campos elétricos, magnéticos e/ou vibrações contínuas e/ou pulsáteis, também podem interferir; ainda que a maioria dos equipamentos/procedimentos não o consiga fazer (1).
Ainda que os dispositivos apresentem mecanismos de segurança, na realidade, qualquer aparelho elétrico poderá conseguir causar interferências (1). A consequência dessa interação irá variar consoante o patamar de dependência do indivíduo perante o pacemaker (1).
-com gravidade discreta
Considera-se aceitável o contato com os eletrodomésticos no global. Deve-se evitar contato em más condições de funcionamento, sobretudo em contexto de fenómenos eletrostáticos. Geralmente também não é costume existir relevância com escadas rolantes e portas automáticas. Sem evidência que causem interferência consideram-se os automóveis, autocarros, aviões e motocicletas; ainda que se recomende não aproximar do motor em funcionamento, tal como não entrar na cabine do piloto de avião (risco de interferência com os aparelhos de comunicação) (2).
-com gravidade moderada (aceitável com riscos):
-colchões magnéticos e mini-imans (por exemplo, fecho de colares)
Devem ser feitos ajustes no pacemaker; mínimo três centímetros
-telefones sem fios, telemóveis, bluetooth, walkie talkie, wireless/wifi
Distancia mínima de 15 centímetros até 3 watts de potência ou 30 se entre 3 a 15 watts
Telefone e walkie-talkie no ouvido contralateral e não colocar no bolso da roupa no tórax (camisa ou blaiser)
-antenas de telefone
Mínimo três metros até 200 watts
-ipod MP3
Mínimo de 45 centímetros
-eletocauterização
Procurar alternativas ao bisturi
Preferir bipolar e monitorizar em programação assíncrona, pulsos de curta duração
-radioterapia
Proteção local com barreira de chumbo
Reprogramar para modo assíncrono
-desfibrilação externa
Mínimo 15 centímetros
-íman
Reprogramação assíncrona
-ablação por radio frequência
Distância mínima de dois centímetros
Programação em modo assíncrono
-litotrípsia
Modo bipolar assíncrono
-aparelhos com vibrações mecânicas
Evitar furadeiras elétricas, máquinas de barbear, escovas elétricas e corta-relva
-sistemas de deteção de metais e anti-roubo
Interferências dependem da distância e tempo de exposição
Recomendação de passar rapidamente
-estimulação transcutânea, eletro-acupuntura
Evitar tórax e membro superior homolateral em pacemakers com sensibilização unipolar
-radares de navegação militares
Interferência é diretamente proporcional à potência e proximidade; apenas grandes aparelhos fazem interferências significativas
-torres de transmissão de energia elétrica
-CEM podem interferir
Distância mínima de quatro metros
-CEM de grandes fontes (geradores a óleo, amplificadores de som e/ou caixas acústicas volumosas)
Sem perímetro seguro definido
-CEM de linhas de alta tensão
Roupas isolantes dão alguma proteção até 400 Kv e à distância mínima de quatro metros
-montagem de televisões e soldadura por radiofrequência
Interferências temporárias
-desporto sem esforço
Desde que não se use a musculatura peitoral com intensidade e se programado com sensibilidade bipolar
-mecânico-auto
Ignição pode interferir
Distância mínima de 50 centímetros
-aparelhos de diatermia dental
Distância mínima de 35 centímetros
-secador de cabelo
Pode causar reversão magnética no marcapasso
Distância mínima de 15 centímetros (2).
-com gravidade elevada
Considera-se inaceitável a RMN e o uso de medidor de gordura corporal, segundo alguns autores. São também desaconselhados os procedimentos associados a Litotrícia, Colchões magnéticos e Soldadura com arco voltaico acima de 300 amperes (2).
Contudo, realça-se que se encontrou um caso clínico de uma RMN executada em paciente com pacemaker, no qual apenas se referiu sensação de queimor e aparecimento de disrrimia não grave, que permitiu concluir o exame, sem consequências permanentes ou graves; o artigo não foi incluído nesta revisão por ser de 2005, logo, nove anos antes do nosso limite temporal escolhido.
Postura da Equipa de Saúde e Segurança Ocupacionais
Antes de o trabalhador regressar ao posto de trabalho, após colocação de pacemaker, deverá ser feita uma avaliação eletromagnética do local; apesar de os dispositivos mais modernos estarem melhor protegidos, sobretudo se bipolares (4). Os pacemakers podem sofrer interferências dos CEMs e, por isso, o ambiente laboral destes funcionários deverá ser avaliado neste contexto, segundo a diretiva europeia 2013/35/EU. Deverão ser consideradas as situações mais gravosas, ou seja, o maior número de horas de exposição, na maior intensidade e proximidade. O CEM deverá ser caraterizado a nível de energia, frequência e outros parâmetros relevantes (5)- pois a exposição aos CEMs intensos pode interferir com os marcapassos. Várias organizações publicaram pontos de corte/valores de referência para esta situação, como a ANSI (American National Standards Institute), ICNIRP (International Comission on non-Ionizing Radiation Protection) e a União Europeia (6).
DISCUSSÃO/ CONCLUSÃO
Não existem consensos absolutos em relação ao que é seguro e o que não é; ainda assim, a generalidade dos investigadores concorda que os equipamentos são construídos cada vez com mais qualidade perante as interferências domiciliares, sociais e laborais e que existem situações que quase de certeza não causam problemas e outras que provavelmente o farão, existindo um outro grupo de fatores em posição intermédia.
Seria interessante perceber se as empresas portuguesas têm noção das interferências que podem surgir e se preocupam em minimizar o perigo, perante os funcionários que se identificam como portadores deste tipo de equipamento aos profissionais de saúde, sobretudo nos postos com maquinaria/tarefas mais relevantes neste contexto.
CONFLITOS DE INTERESSE, QUESTÕES ÉTICAS E/OU LEGAIS
Nada a declarar.
AGRADECIMENTOS
Nada a declarar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- 1. Gauch P, Halperin C, Galvão S, Paola A, Mateos J, Martinelli M et al. Orientações a respeito das interferências sobre marcapassos cardíacos. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. 1997; 68(2): 135-142.
- 2. Martinelli M, Zimerman L, Lorga A, Vasconcelos J, Fagundes A, Barros A et al. Diretrizes Brasileiras de Dispositivos Cardíacos Eletrónicos Implantáveis (DCEI). Arquivos Brasileiros de Cardiologia. 2007; 89(6): e210-e237.
- 3. Markman B, Sousa A, Issa A, Nascimento B, Correa H, Vieira M et al. Diretriz Brasileira de Dispositivos Cardíacos Eletrónicos implantáveis- 2023. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. 2023; 120(1): e20220892
- 4. Tiikkaja M, Aro A, Alanko T, Lindholm H, Sistonen H, Hartikainen et al. Electromagnetic interference with cardiac pacemakers and implamtable cardioverter-defibrillators from low-frequency electromagnetic fileds in vivo. Europace. 2013(15): 388-394. DOI: 10.1093/europace/eus345
- 5. Mattei E, Censi F, Calcagnini G, Falsaperla R. Workers with cardiac AIMD exposed to EMF: methods and case studies for risk analysis in the framework of the european regulations. International Journal of Environmental Research and Public Health. 2021; 18: 9709. DOI: 10.3390.ijerph18189709
- 6. Driessen S, Napp A, Schmiedchen K, Hraus T, Stunder D. Eletromagnetic interference in cardiac eletronic implants caused by novel electrical appliances emitting electromanetic fields in the intermediate frequency range: a systematic review. European Society of Cardiology: Europace (2019); 21: 219-229. DOI: 10.1093/europace/euy155
Quadro 1: Pesquisa efetuada
Motor de busca | Password 1 | Password 2 e seguintes, caso existam | Critérios | Nº de documentos obtidos | Nº da pesquisa | Pesquisa efetuada ou não | Nº do documento na pesquisa | Codificação inicial | Codificação final |
RCAAP | Pacemaker | -título e/ ou assunto
|
85 | 1 | Sim | – | – | – | |
Marcapasso | 45 | 2 | Sim | 1º, mas fora do prazo temporal | |||||
EBSCO (CINALH, Medline, Database of Abstracts and Reviews, Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Nursing & Allied Health Collection e MedicLatina) | Pacemaker | -2013 a 2023
-acesso a resumo -acesso a texto completo |
5428 | 3 | Não | – | – | – | |
+work | 154 | 4 | Sim | 100 | PW1 | 4 | |||
+occupational | 39 | 5 | Sim | 2
14 |
P01
P02 |
5
6 |
Nota: dada a escassez de literatura, utilizou-se também o motor de busca generalista Google e, utilizando as mesmas palavras-passe, obtiveram-se três documentos (1,2,3).
Quadro 2: Caraterização metodológica dos artigos selecionados
Artigo | Caraterização metodológica | País | Resumo |
1 | Guideline | Brasil | Neste documento estão resumidas algumas diretrizes em relação a interferências com estes equipamentos, divididas em domésticas, sociais e profissionais. Os autores fazem algumas considerações específicas para o setor hospitalar, a nível de procedimentos médicos terapêuticos e de diagnóstico. |
2 | Nestas guidelines os autores avaliam questões associadas à implantação e indicações para colocar este tipo de dispositivos, bem como recomendações associadas. | ||
3 | Neste documento encontram-se informações equivalentes aos dois anteriores aqui mencionados. | ||
4- | Estudo original | Finlândia | Os autores tiveram como objetivo avaliar a eventual interferência eletromagnética em trabalhadores com cardiodesfibrilador implantado, sobretudo em postos com campos eletromagnéticos elevados. |
5 | Caso clínico | Itália | Neste artigo faz-se a avaliação de trabalhadores expostos a campos eletromagnéticos, coordenando tal com as diretrizes europeias e a apresentação de três casos clínicos. |
6 | Estudo de revisão | Alemanha | Trata-se de uma revisão bibliográfica que incide na eventual interferência dos campos eletromagnéticos nestes equipamentos, salientando a falta de consensos em alguns pontos. |
(1)Mónica Santos
Licenciada em Medicina; Especialista em Medicina Geral e Familiar; Mestre em Ciências do Desporto; Especialista em Medicina do Trabalho; Diretora da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online; Técnica Superior de Segurança no Trabalho; Doutorada em Segurança e Saúde Ocupacionais e CEO da empresa Ajeogene Serviços Médicos Lda (que coordena os projetos Ajeogene Clínica Médica e Serviços Formativos e 100 Riscos no Trabalho). Endereços para correspondência: Rua da Varziela, 527, 4435-464 Rio Tinto. E-mail: s_monica_santos@hotmail.com. ORCID Nº 0000-0003-2516-7758
Contributo para o artigo: seleção do tema, pesquisa, seleção de artigos, redação e validação final.
(2)Armando Almeida
Escola de Enfermagem (Porto), Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica Portuguesa; Centro de Investigação Interdisciplinar em Saúde; Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional. 4420-009 Gondomar. E-mail: aalmeida@ucp.pt. ORCID Nº 0000-0002-5329-0625
Contributo para o artigo: seleção de artigos, redação e validação final.
(3)Dina Chagas
Doutorada em Higiene, Saúde e Segurança no Trabalho; Pós-Graduada em Segurança e Higiene do Trabalho; Pós-Graduada em Sistemas Integrados de Gestão, Qualidade, Ambiente e Segurança. Professora convidada no ISEC Lisboa. Membro do Conselho Científico de várias revistas e tem sido convidada para fazer parte da comissão científica de congressos nos diversos domínios da saúde ocupacional e segurança do trabalho. Colabora também como revisor em várias revistas científicas. Galardoada com o 1.º prémio no concurso 2023 “Está-se Bem em SST: Participa – Inova – Entrega-Te” do projeto Safety and Health at Work Vocational Education and Training (OSHVET) da EU-OSHA.1750-142 Lisboa. E-Mail: dina.chagas2003@gmail.com. ORCID N.º 0000-0003-3135-7689.
Contributo para o artigo: seleção de artigos, redação e validação final.