Santos M, Almeida A, Lopes C, Oliveira T. Medicina Dentária e Saúde Ocupacional em Portugal- Estudo Exploratório. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. 2020, volume 9, 1-20. DOI: 10. 31252.27.06.2020
DENTAL MEDICINE AND OCCUPATIONAL HEALTH IN PORTUGAL– EXPLORATORY STUDY
TIPO DE ARTIGO: Observacional descritivo transversal
AUTORES: Santos M(1), Almeida A(2) Lopes C(3), Oliveira T(4).
RESUMO
Introdução/ enquadramento/ objetivos
Segundo a bibliografia consultada, os principais fatores de risco/ riscos laborais dos médicos dentistas e auxiliares de dentária, são o eventual contato com agentes biológicos, posturas mantidas/ forçadas, movimentos repetitivos, vibrações, ruido, radiações eletromagnéticas, radiações ionizantes por Rx, esforço visual e agentes químicos.
Apesar dos riscos estarem bem identificados, não se encontraram estudos em Portugal, que explorassem a consciencialização dos profissionais face aos riscos, o seu comportamento face ao uso de equipamentos de proteção individual, descrição de acidentes laborais, existência de doença profissional ou o recurso à equipa de Saúde Ocupacional, pelo que se projetou este estudo exploratório com o objetivo de identificar necessidades passíveis de intervenção.
Metodologia
Estudo observacional, descritivo e transversal, realizado através de um questionário anónimo, respondido por via eletrónica. A amostra foi obtida por conveniência após contato com diversas instituições ligadas ao setor. Cada profissional tinha a possibilidade de responder apenas uma vez, utilizando o link disponibilizado.
Resultados
A amostra é constituída apenas por 33 trabalhadores, na sua grande maioria do género feminino, com ensino superior concluído, a exercer na área da saúde dentária e com mais de dez anos de experiência profissional acumulada; os fatores de risco/ riscos mais valorizados foram as posturas mantidas/ forçadas, movimentos repetitivos, ruído, agentes biológicos, turnos prolongados e o stress; o agente químico mais citado/ valorizado foi o hipoclorito; os equipamentos de proteção mais usados foram a bata/ farda, máscara e luvas e os menos usados os protetores auriculares, as viseiras e os gorros; a maioria nunca teve um acidente laboral e os sinistros mais frequentes foram o corte e o contato com fluidos capazes de transmitir patologias infeciosas; contudo, no global, 82% negou limitações laborais pós-acidente; as hérnias, bursites e tendinites, foram as patologias mais referenciadas como atribuídas à atividade laboral, mas nenhuma declarada como suspeita de doença profissional; é muito comum a existência de sintomas associados ao trabalho, sobretudo algias em diversas zonas corporais; a perceção sobre a utilização dos serviços de Saúde Ocupacional é inferior à recomendada e exigida por lei.
Conclusões
O estudo não pode ser considerado representativo deste setor profissional uma vez que o reduzido tamanho da amostra não possibilita a generalização dos achados, nem fornecer informações que permitam inferir relações de causa efeito. No entanto, a leitura dos resultados permitiu identificar algumas áreas potencialmente problemáticas ao nível da consciencialização face aos riscos laborais, utilização de equipamentos de proteção individual, acompanhamento da sintomatologia e utilização dos serviços de Saúde Ocupacional.
Expressões/ Palavras-Chave: medicina dentária, dentista, auxiliar de medicina dentária; saúde ocupacional, saúde do trabalhador e medicina do trabalho.
ABSTRACT
Introduction / framework / objectives
According to the consulted bibliography, the main risk/ risk factors of dental professionals are the eventual contact with biological agents, maintained/ forced postures, repetitive movements, vibrations, noise; electromagnetic radiation and Rx ionizing radiation, visual efford and chemical agents.
Despite the risks being well identified, no studies were found in Portugal that explored the professionals’ awareness of the risks, their behavior regarding the use of personal protective equipment, the description of occupational accidents, the existence of occupational disease or the recourse to the occupational health team. This exploratory study was designed to identify possible occupational health needs that are not described, which may be subject to intervention.
Methodology
This is an observational, descriptive and cross-sectional study, carried out through an anonymous questionnaire, answered by electronic means. The sample was obtained for convenience after contacting several institutions related to the sector. Each professional contacted had the possibility to respond only once using the link provided.
Results
The sample consists of only 33 workers. The vast majority are female, with higher education completed, practicing dentistry and with more than 10 years of accumulated professional experience. The most valued risk/ risk factors were maintained/ forced postures, repetitive movements, noise, biological agents, prolonged shifts and stress. The most cited/ valued chemical agent was hypochlorite. The most used protective equipment was the uniform, mask and gloves and the least used was ear protectors, visors and caps. Only few had an accident at work and the most frequent were cutting and contact with fluids capable of transmitting infectious pathologies; however, 82% denied post-accident work limitations. The most referenced pathologies were hernias, bursitis and tendinitis, attributed to work activity, but none was declared as a suspected occupational disease. It was very common to have symptoms associated with work, especially pain in different body areas. The perception of the use of Occupational Health services is lower than that recommended and required by law.
Conclusions
The study cannot be considered representative of this professional sector since the small sample size does not allow the generalization of the findings, nor does it provide information that allows inferring cause-and-effect relationships. However, reading the results allowed to identify some potentially problematic areas in terms of awareness of occupational risks, use of personal protective equipment, monitoring of symptoms and use of Occupational Health services.
Expression/ Keywords: dental medicine, dentist, dental assistant; occupational health, worker health, and occupational medicine.
INTRODUÇÃO
Os principais fatores de risco/ riscos laborais dos médicos dentistas, higienistas e auxiliares de dentária são o eventual contato com agentes biológicos relevantes por corte, inalação ou contato por mucosa (e infeções associadas); posturas mantidas/ forçadas, movimentos repetitivos e vibrações (e consequentes lesões músculo-esqueléticas); ruido (e eventual hipoacusia); radiações eletromagnéticas (com consequências não consensuais na literatura) e esforço visual por utilização inadequada da iluminância (e eventual cansaço, perda de acuidade); radiação ionizante por Rx (e possíveis consequências cancerígenas); agentes químicos (e eventuais patologias oncológica, neurológica, dermatológica, respiratória e otorrinolaringológica, sobretudo), bem como stress (em função da personalidade e capacidade de coping do funcionário, com eventuais depressão/ burnout associados).
Por sua vez, as restantes classes profissionais (administrativos, gestores) estão sujeitas a radiações eletromagnéticas, esforço visual, postura sentada mantida e movimentos repetitivos a nível de rato/ teclado.
Apesar dos riscos estarem bem identificados, não se encontraram estudos, em Portugal, que explorassem a consciencialização dos profissionais face aos riscos, o seu comportamento face ao uso de equipamentos de proteção individual, a descrição de acidentes laborais, a existência de doença profissional ou o recurso à equipa de Saúde Ocupacional, pelo que se projetou este estudo exploratório para se conhecer melhor as necessidades laborais deste setor.
METODOLOGIA
Após realização de uma revisão bibliográfica integrativa sobre o tema (1), os autores elaboraram um questionário on line e remeteram-no por e-mail, a instituições que pudessem ter como colaboradores indivíduos deste setor profissional.
Optou-se por um questionário anónimo, ainda que estivesse bloqueada a possibilidade de responder mais do que uma vez, caso algum indivíduo tivesse motivação para enviesar os resultados, respondendo várias vezes.
Posteriormente, dado o número muito escasso de respostas, foi realizado um contato telefónico com diversas instituições, no sentido de apresentar o projeto (identificar as necessidades de Saúde Ocupacional do ponto de vista dos trabalhadores, neste setor profissional) e incentivar a participação; contudo, é notória a desvalorização da população e das instituições pela Saúde Laboral, na generalidade dos setores profissionais, pelo que, 12 meses volvidos, apenas se reuniram 33 questionários.
Dado o número ser muito inferior ao que permitiria generalizar as conclusões para a população que se pretendia estudar, os autores optaram por não desperdiçar os dados de quem gentilmente colaborou e proceder ao tratamento estatístico descritivo, sem pretender generalizar os achados, nem estabelecer relações de causa efeito. Nesse sentido, pode ser classificado como um estudo exploratório, observacional, descritivo e transversal.
RESULTADOS
Como já foi revelado, a taxa de resposta ao inquérito foi muito reduzida a as respostas foram recolhidas antes da situação pandémica por SARS-CoV2.
A nível socioprofissional a amostra é constituída maioritariamente por profissionais do género feminino (n=24), com ensino superior concluído (n=23), a exercer medicina dentária (n=20) e com mais de dez anos de experiência profissional acumulada (n=17) (tabela 1); se se tiver em conta apenas os elementos que exercem medicina dentária, poder-se-á dizer que a amostra é representativa da população, tendo em conta que os dados censitários de 2019, revelados pela Ordem dos Médicos Dentistas (2), em função de idade e género. É de realçar, no entanto, a inexistência de respostas por parte de outras classes profissionais que também exercem em clínicas dentárias, como por exemplo, rececionistas ou trabalhadores da limpeza, fatores que não permitem retratar, na totalidade, o ambiente profissional e respetivos riscos laborais do setor. Em termos de distribuição etária, observa-se um equilíbrio entre as diferentes faixas (tabela 1), sendo as menos representadas, como seria expectável, as faixas limítrofes (os mais novos e os mais idosos), facto que se enquadra quer nos padrões da população ativa nacional, como nos padrões sociodemográficos dos médicos dentistas em Portugal (2).
Tabela 1- Variáveis socioprofissionais
Variáveis | n | % | |
Idade | [21-30 anos] | 10 | 30,3 |
[31-40 anos] | 11 | 33,3 | |
[41-50 anos] | 9 | 27,3 | |
[51-60 anos] | 3 | 9,1 | |
Género | Feminino | 24 | 72,7 |
Masculino | 9 | 27,3 | |
Escolaridade | Ensino Técnico profissional | 3 | 9,1 |
Ensino secundário | 7 | 21,2 | |
Ensino superior | 23 | 69,7 | |
Profissão | Gestor/ orçamentista | 2 | 6,1 |
Assistente médico | 11 | 33,3 | |
Médico dentista generalista | 14 | 42,4 | |
Médico dentista especializado | 6 | 18,2 | |
Tempo de serviço | Menos de 1 ano | 3 | 9,1 |
1 a 5 anos | 8 | 24,2 | |
6 a 10 anos | 5 | 15,2 | |
Mais de 10 anos | 17 | 51,5 |
Fatores de risco/ riscos laborais
Analisando os fatores de risco/ riscos laborais, verificou-se apenas uma reduzida percentagem de respostas que consideravam a inexistência de risco em alguns dos parâmetros considerados; em situação oposta, ninguém da amostra referiu que as posturas forçadas/ mantidas, movimentos repetitivos, ruído risco biológico ou stress tivessem um risco nulo (gráfico 1).
As respostas demonstram que os riscos mecânicos resultantes da manutenção de posturas forçadas e da realização de movimentos repetitivos são os mais percecionados/ valorizados, resultados consistentes com a bibliografia consultada que descreve que os médicos dentistas permanecem prolongadamente em posturas mantidas e/ou forçadas (3) (4) (5) (6) e quase sempre estáticas (7), executando apenas alguns movimentos repetitivos associados, normalmente, sem pausas adequadas (7) (8).
A perceção de risco físico provocado pelo ruído surge em terceiro lugar na escala de gravidade e é possível constatar que a exposição profissional a este fator é bastante relevante tendo em conta os diferentes aparelhos utilizados para o tratamento dentário (8) (9) (10); este fator poderá não só ter repercussões a longo prazo, como a hipoacusia (10).
Seguem-se, na ordem de perceção de gravidade, precisamente, os riscos psicossociais causados pela exposição ao stress, que segundo alguns estudos resulta de uma conjugação complexa entre a existência de posturas forçadas e/ ou mantidas, exigência e meticulosidade das tarefas, exposição a riscos biológicos (11), interação constante com os clientes (8) (11) e a exposição ao ruído (9).
O risco de exposição a agentes biológicos apenas surge em quinto lugar, facto que na atual situação de pandemia, provavelmente estaria sobrevalorizado. Na realidade alguns estudos, pré situação pandémica, revelam que os agentes biológicos mais relevantes eram os vírus das hepatites B e C, bem como o HIV (12) (13) (14), com riscos médios de infeção de 3 a 10, 10 e 0,2 a 0,3%, respetivamente. O risco aparenta ser mais relevante nos profissionais com mais idade, mais anos de experiência profissional e menor adesão às normas existentes (12), fatos que não se comprovaram estatisticamente, nesta pequena amostra.
Numa posição intermédia surgem a realização de turnos prolongados, fator considerado por alguns estudos como catalisador, quer para o desenvolvimento de lesões músculo-esqueléticas, como para o aumento do stress (15) (16); bem como o uso de radiação ionizante para realizar exames auxiliares de diagnóstico, que apesar de serem poucos os estudos encontrados a considerar este fator (8), na realidade, apesar do risco ser reduzido (com a adoção das medidas obrigatórias de proteção), a probabilidade de exposição é grande, dada a frequência de utilização (1).
Nos fatores de risco menos valorizados pelos profissionais emergem o risco químico, que não é congruente com a diversidade de compostos utilizados no setor, como o mercúrio (17) (18), álcoois, éter, gluteraldeído, formol, hipoclorito (17), entre outros; quer agentes usados para a desinfeção de materiais ou limpeza de superfícies, que poderá ser explicado pela falta de informação acerca dos efeitos nocivos desses produtos, como aponta um dos estudos consultados (17). Também poderá haver risco provocado por radiação ultravioleta, utilizada para a polimerização das resinas (9), que pode ocasionar reações nos olhos e pele (mãos) do operador; e, por último, as vibrações transmitidas às mãos pelos aparelhos utilizados, que são potencialmente coadjuvantes do aparecimento de lesões músculo-esqueléticas, como a síndrome do túnel cárpico, podendo ainda diminuir a performance e concentração, aumentando o risco de acidente (19).
Foi ainda questionado, em regime de pergunta aberta, quais os agentes químicos considerados mais pertinentes a nível de risco ocupacional. Os referenciados mais regularmente foram os produtos de limpeza, com particular destaque para o hipoclorito de sódio, nomeado por oito vezes; é evidente, no entanto, que o risco químico não é considerado como uma ameaça por grande parte dos trabalhadores, uma vez que quase metade da amostra não referiu qualquer produto (17).
Uso de EPIs
Analisando os resultados relativos à utilização de EPIs, observa-se que o uso de farda, máscara e luvas é consensual para a grande maioria dos trabalhadores (gráfico 2); é de realçar o facto, no entanto, de ser pouco usual o uso da viseira (que dá uma ótima proteção para face e olhos), bem como dos manguitos e gorro (que protegem em relação a agentes químicos e/ ou biológicos evitando o seu transporte para fora do consultório e/ ou o contato prolongado e intenso com a pele) (Gráfico 2).
Simultaneamente, apesar do ruído ser referido consistentemente por todos os profissionais, a grande maioria não utiliza qualquer tipo de proteção auricular (apenas um indivíduo refere que utiliza frequentemente e, por isso, considera que o ruído não é um fator de risco considerável), sendo importante referir que alguns equipamentos conseguem atingir mais que os 85 decibéis definidos por lei (8) (gráfico 2).
Analisando os resultados em função das diferentes profissões observa-se, como seria expectável, uma grande diferença entre os trabalhadores que prestam diretamente cuidados de saúde oral (que utilizam frequentemente a maioria dos EPIs) e os que exercem cargos de gestão/ orçamentação (tabela 2).
Tabela 2- Utilização de EPIs em função da profissão
Uso de EPI | Gestor/ orçamentista | Assistente | Médico dentista generalista | Médico dentista especializado | |
Farda/ bata | Não tenho | 1 | 0 | 0 | 0 |
Tenho e uso com frequência | 1 | 11 | 14 | 6 | |
Máscara | Não tenho | 1 | 0 | 0 | 0 |
Tenho mas não uso | 1 | 0 | 0 | 0 | |
Tenho mas uso pouco | 0 | 2 | 0 | 0 | |
Tenho e uso com frequência | 0 | 9 | 14 | 6 | |
Viseira | Não tenho | 1 | 5 | 7 | 0 |
Tenho mas não uso | 1 | 1 | 0 | 2 | |
Tenho mas uso pouco | 0 | 3 | 6 | 3 | |
Tenho e uso com frequência | 0 | 2 | 1 | 1 | |
Luvas | Não tenho | 1 | 0 | 0 | 0 |
Tenho mas não uso | 1 | 0 | 0 | 0 | |
Tenho e uso com frequência | 0 | 11 | 14 | 6 | |
Óculos | Não tenho | 1 | 0 | 2 | 0 |
Tenho mas não uso | 1 | 3 | 1 | 1 | |
Tenho mas uso pouco | 0 | 4 | 3 | 3 | |
Tenho e uso com frequência | 0 | 4 | 8 | 2 | |
Proteção auricular | Não tenho | 1 | 11 | 14 | 5 |
Tenho mas não uso | 1 | 0 | 0 | 0 | |
Tenho e uso com frequência | 0 | 0 | 0 | 1 | |
Gorro | Não tenho | 1 | 7 | 9 | 1 |
Tenho mas não uso | 1 | 1 | 1 | 0 | |
Tenho mas uso pouco | 0 | 3 | 3 | 1 | |
Tenho e uso com frequência | 0 | 0 | 1 | 4 | |
Manguitos | Não tenho | 1 | 10 | 11 | 3 |
Tenho mas não uso | 1 | 1 | 0 | 1 | |
Tenho mas uso pouco | 0 | 0 | 2 | 1 | |
Tenho e uso com frequência | 0 | 0 | 1 | 1 |
Acidentes de trabalho e doenças profissionais
O estudo revela que mais de metade dos indivíduos da amostra afirmou nunca ter tido qualquer tipo de acidente laboral (tabela 3); os números, na bibliografia consultada, revelam uma percentagem superior de acidentes (13) (14) (20), atribuídos às reduzidas dimensões do campo de atuação, ao uso de instrumentos cortantes e/ ou com elevada rotação (13) (14) (20), à frequente formação de aerossóis e salpicos e à proximidade física com o cliente e suas reações físicas (13) (20); contudo, convém relembrar que o reduzido tamanho da amostra não permite estabelecer comparações, ainda que se acredite que os valores em Portugal possam ser bem mais reduzidos que noutras realidades, com menos recursos, formação e regras de higiene e segurança mais ténues (1).
Tabela 3- Número de acidentes profissionais elencados
Sim | Não | |||
n | % | n | % | |
Já teve algum acidente a trabalhar nesta área? | 14 | 42,4 | 19 | 57,6 |
Em caso afirmativo, ficou com alguma limitação associada ao trabalho? | 4 | 28,6 | 10 | 71,4 |
Tem alguma doença que considere estar associada ao trabalho? | 12 | 36,4 | 21 | 63,6 |
Alguma foi declarada como doença profissional à Segurança Social | 0 | 0 | 12 | 100 |
Analisando quais os acidentes de trabalho mais frequentemente identificados, surgem em destaque o corte (n=13) e o eventual contato com fluidos capazes de transmitir patologia infeciosa (n=11), ambos compatíveis com a evidência consultada (13) (14) (20) e ainda, com menos expressividade, a queimadura (n=5) e o entorse (n=4); surpreendentemente, apesar de não ser encarado como fator de risco problemático, constata-se que três trabalhadores referiram a exposição a agentes químicos como resultado de acidente laboral (gráfico 3).
Averiguou-se também se após os acidentes de trabalho existiram ou não limitações laborais permanentes e a maioria (n=10) negou que tal tivesse acontecido (tabela 3); acrescenta-se ainda que, dos quatro restantes, apenas houve relato de consequências ligeiras e provisórias para a saúde dos trabalhadores.
Doença profissional e sintomatologia associada ao trabalho
No que diz respeito ao desenvolvimento de doença profissional, mais de um terço da amostra (n=12) revelou suspeitar da sua existência, sem que tenha sido declarada como suspeita de doença profissional à Segurança Social (tabela 4); para a caraterização das doenças, foi pedido que as nomeassem através de uma resposta aberta, o que dificultou o tratamento dos dados, dada a heterogeneidade da terminologia usada, pelo que fica mais difícil contabilizar. De uma forma genérica poder-se-á dizer que foram mais salientadas as hérnias, bursites e tendinites (ainda que não esteja claro se o diagnóstico é de suposição em função dos sintomas ou se efetivamente este estava comprovado com exames auxiliares de diagnóstico).
Tabela 4- Número de doenças profissionais elencadas
Sim | Não | |||
n | % | n | % | |
Tem alguma doença que considere estar associada ao trabalho? | 12 | 36,4 | 21 | 63,6 |
Alguma foi declarada como doença profissional à Segurança Social | 0 | 0 | 12 | 100 |
A grande maioria dos indivíduos referiu ter sintomas que consideravam, subjetivamente, estar associados ao seu trabalho (gráfico 4), sendo de destacar a dor, referida quase unanimemente por toda a amostra. São ainda de realçar a irritabilidade ocular (n=12), potencialmente provocada pelo esforço visual resultante de uma inadequada iluminância (baixa ou com encandeamento) (1) (3) (8) (9) e a diminuição da acuidade auditiva (n=10), sendo de relembrar a baixa adesão aos equipamentos de proteção, referenciada anteriormente.
Analisando a dor, constata-se que há uma grande diversidade de queixas, distribuídas por diversos setores anatómicos, sendo de destacar a prevalência nas regiões cervical (n=26), lombar (n=26), dorsal (n=22), ombros (n=22) e pulsos (n=21), uma vez que são referidas por mais de metade da amostra (gráfico 5). Mais uma vez se constata que a conjugação entre posturas estáticas mantidas, movimentos repetitivos, turnos prolongados e exposição manual a vibrações.
Vigilância por parte da Saúde Ocupacional
Analisando a perceção dos participantes acerca dos contatos que mantinham com os serviços de saúde ocupacional, constata-se que somente dezanove trabalhadores revelaram ter Exame de Medicina do Trabalho, pelo menos, de dois em dois anos, como é exigido por lei (tabela 5); o mesmo se observa com a formação sobre riscos laborais, existindo apenas 20 indivíduos que referiram já ter tido essa experiência anteriormente (tabela 5); o teste do Qui Quadrado revela a existência de uma associação estatisticamente significativa entre as duas variáveis (X2=3,970; p=0,046), demonstrando que, quem tem acesso regular às consultas tem maior probabilidade de ter formação sobre riscos laborais. Por último, constata-se que a perceção sobre o papel e atuação dos Técnicos de Segurança é substancialmente reduzida (n=14) (tabela 5), o que obriga a repensar a forma como se fornece este tipo de serviços, tendo em conta que existem riscos considerados relevantes e cuja legislação é bastante rigorosa.
Tabela 5 – Perceções acerca da atuação dos serviços de Saúde Ocupacional
Sim | Não | |||
n | % | n | % | |
Tem exames com o Médico do Trabalho de 2/2 anos | 19 | 59,4 | 13 | 40,6 |
Conhece a atuação do Técnico de Higiene e Segurança | 14 | 42,4 | 19 | 57,6 |
Já teve formação sobre riscos laborais | 20 | 60,6 | 13 | 39,4 |
CONCLUSÕES
O estudo não pode ser considerado representativo deste setor profissional uma vez que o reduzido tamanho da amostra não possibilita a generalização dos resultados, nem fornecer informações que permitam inferir relações de causa efeito. No entanto, a leitura dos resultados permitiu identificar algumas áreas potencialmente problemáticas ao nível da consciencialização face aos riscos laborais, utilização de equipamentos de proteção individual, acompanhamento da sintomatologia e utilização dos serviços de saúde ocupacional.
CONFLITOS DE INTERESSE, QUESTÕES ÉTICAS E/OU LEGAIS
Nada a declarar.
AGRADECIMENTOS
Não se aplicam.
BIBLIOGRAFIA
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(1)Mónica Santos
Licenciada em Medicina; Especialista em Medicina Geral e Familiar; Mestre em Ciências do Desporto; Especialista em Medicina do Trabalho e Doutoranda em Segurança e Saúde Ocupacionais, na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Presentemente a exercer nas empresas Medicisforma, Servinecra, Securilabor e Medimarco; Diretora Clínica da empresa Quercia; Diretora da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. Endereços para correspondência: Rua Agostinho Fernando Oliveira Guedes, 42, 4420-009 Gondomar. E-mail: s_monica_santos@hotmail.com
(2)Armando Almeida
Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária, com Competência Acrescida em Enfermagem do Trabalho. Doutorado em Enfermagem; Mestre em Enfermagem Avançada; Pós-graduado em Supervisão Clínica e em Sistemas de Informação em Enfermagem; Professor Auxiliar Convidado na Universidade Católica Portuguesa, Instituto da Ciências da Saúde – Escola de Enfermagem (Porto) onde Coordena a Pós-Graduação em Enfermagem do Trabalho; Diretor Adjunto da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. 4420-009 Gondomar. E-mail: aalmeida@porto.ucp.pt
(3)Catarina Lopes
Licenciada em Enfermagem, desde 2010, pela Escola Superior de Saúde Vale do Ave. A exercer funções na área da Saúde Ocupacional desde 2011 como Enfermeira do trabalho autorizada pela Direção Geral de Saúde, tendo sido a responsável pela gestão do departamento de Saúde Ocupacional de uma empresa prestadora de serviços externos durante 7 anos. Atualmente acumula funções como Enfermeira de Saúde Ocupacional e exerce como Enfermeira Generalista na SNS24. Encontra-se a frequentar o curso Técnico Superior de Segurança do Trabalho. 4715-028. Braga. E-mail: catarinafflopes@gmail.com
(4)Tiago Oliveira
Licenciado em Enfermagem pela Universidade Católica Portuguesa. Frequenta o curso de Técnico Superior de Segurança no Trabalho. Atualmente exerce a tempo inteiro como Enfermeiro do Trabalho. No âmbito desportivo desenvolveu competências no exercício de funções de Coordenador Comercial na empresa Academia Fitness Center, assim como de Enfermeiro pelo clube de futebol União Desportiva Valonguense. 4435-718 Baguim do Monte. E-mail: tiago_sc16@hotmail.com